"Papai, o que é isso ?": Desastre do voo 593, avião comercial russo comandado por um menino

Ocorreu em 23 de março de 1994. Um desastre de tais proporções que modificou para sempre alguns dos sistemas de pilotagem comercial de um avião. Ninguém soube o que tinha acontecido realmente até que escutaram as gravações de voz e dados da caixa preta. O que recolheram resultava insólito. O avião era um Airbus A310-300 da Aeroflot, o vôo 593 da empresa aérea russa que devia fazer a rota entre Moscou e Hong Kong. A bordo iam 63 passageiros e 12 tripulantes.

Papai, o que é isso? Desastre




A tripulação era formada por cinco pessoas na cabine, ainda que nem todos eram profissionais da aviação. O capitão ao comando, Yaroslav Kudrinsky, o co-piloto, Igor Piskaryov, outro piloto reserva, Vladimir Makarov -que voava como passageiro-, e os filhos pequenos de Yaroslav.

Air Disaster Aeroflot 593

Ao que parece, tratava-se do primeiro vôo internacional das crianças e o pai tinha decidido que fossem com ele na cabine, fato ao qual não se opuseram nem Igor nem muito menos Vladimir. Os filhos do capitão chamavam-se Eldar (de 16 anos), e Yana (de 12 anos).

O avião já tinha decolado do aeroporto internacional de Sheremetievo sem incidentes e encontrava-se a caminho do aeroporto de Kai Tak em Hong Kong. Por verdade, a maioria dos passageiros eram homens de negócio de Hong Kong e Taiwan que tinham participado de uma série de conferências na cidade moscovita.

O fato de que as crianças estivessem na cabine desde a decolagem era muito incomum. Naquela época, a única coisa que a Aeroflot permitia às famílias dos pilotos era viajar com uma tarifa com desconto uma vez ao ano.

Seja como for, o ocorrido a partir de então foi só descoberto depois da catástrofe, quando recuperaram as gravações da caixa preta do avião e reconstituíram a fatal tomada de decisões por parte do capitão.

As crianças pilotando o avião

Avião comandado por menino
Ilustração do A310. Via: Wikimedia Commons
Uma vez em velocidade de cruzeiro, Yaroslav acionou o piloto automático. Contra todas as normas existentes, a filha do capitão estava sentada na cadeira do comando esquerdo enquanto o pai lhe ensinava algumas características do piloto automático, entre outros, o uso do HDG/S e os submodos NAV para alterar o rumo.

O capitão pretendia aparentar que ajustava o rumo do piloto automático para lhe dar a impressão de que estava girando o avião, ainda que em realidade não tinha controle sobre o mesmo.

Pouco depois, Eldar ocupou o assento do piloto principal. No entanto e diferente de sua irmã, o jovem aplicou suficiente força sobre o painel de controle para desligar o piloto automático durante 30 segundos, antes de voltar a situar o manche em sua posição original. Isto fez com que o computador do voo mudasse os ailerons do avião ao controle manual, enquanto mantinha o controle sobre os outros sistemas de voo.

Os pilotos não perceberam o problema no início

Desastre Voo 593

Quando o piloto automático tentou nivelar o avião à rota programada, entrou em conflito com as entradas de controle, as quais ficaram bloqueadas em uma posição neutra. Ademais e enquanto ocorria, uma luz intermitente e silenciosa dava um alerta. Esta luz servia para dizer aos pilotos da desconexão parcial em curso. Pior, os pilotos, que haviam voado anteriormente em aviões de desenho exclusivamente russos que tinham sinais de advertência sonoros, não notaram.

Alguns instantes depois, Eldar, o jovem adolescente, foi o primeiro a dar-se conta de que algo estava errado. Pouco depois, o indicador da trajetória de voo mudou para mostrar uma nova trajetória à medida que girava. Dado que o giro era contínuo, a trajetória de voo prognosticada na tela era uma autêntica loucura: um giro de 180 graus.

Isto, segundo os registros posteriores, confundiu os pilotos durante uns 9 segundos. Durante esta confusão, o avião passou de um ângulo de 45 graus a quase 90 graus (muitíssimo mais pronunciado para o qual estava desenhado). De fato, o A310 não pode girar abruptamente enquanto mantém a altura, e o avião tinha começado a perder altura de maneira muito rápida.

Os passageiros quase não tiveram tempo de gritar, o aumento das forças G nos próprios pilotos e tripulação fez com que a aventura de colocar a nave no curso e retomar o controle do avião que estava quase em posição vertical fosse pouco menos que um milagre.

O acidente fatal

Tragédia Fatal


O piloto automático não respondia e o avião caía de bico. Com as forças G impedindo alguma manobra, o co-piloto Igor deu um jeito de sair da imersão e girar o aparelho em uma ascensão quase vertical. Depois passou de novo a cair, e ainda que piloto e co-piloto recuperaram o controle e nivelaram as asas, sua altitude era muito baixa para conseguir uma recuperação.

O avião se espatifou em uma encosta da cordilheira de Kuznetsk Alatau, Sibéria, a uma velocidade vertical elevadíssima. Morreram no ato todas as pessoas a bordo.

As torres de controle não haviam recebido nenhuma chamada de socorro antes do acidente e as primeiras investigações não conseguiam decifrar o que tinha ocorrido ali dentro. De fato, a empresa aérea negou, à princípio, que as crianças estivessem na cabine.

A transcrição da caixa preta


Essa foi a crença do público em geral, já que o assunto foi investigado de forma nebulosa onde oficialmente era tratado como um acidente a mais de aviação. Até que a revista moscovita Obozrevatel publicou as transcrições em 28 de setembro de 1994.

As fitas confirmavam de maneira bastante clara que o filho do piloto tinha causado o acidente do avião. Meia hora antes do fatal desfecho, Yaroslav deixou seu assento a sua filha de 12 anos e depois a seu filho de 16 anos. Esta foi a transcrição:

- "Papai, o que é isto?", disse Yana, enquanto sentava-se nos controles. Seu pai assinalou estrelas e luzes da cidade, e advertiu que não pressionasse nenhum botão.

No entanto, a cena torna-se assustadora quando o filho do capitão, Eldar, assume o comando.

- "Olha, olha a terra enquanto se move", diz o garoto ao pai. - "Vamos para a esquerda, girar à esquerda (há uma pausa) O avião está girando?"

- "Genial!", diz Eldar.

No entanto, quatro minutos mais tarde, o adolescente pergunta o seguinte:

- "Por que o avião está girando assim?"

- "O que você fez?", exclama o capitão.

- "Não sei!", responde o garoto.

A partir dai os pilotos percebem que algo está errado, pois o avião tinha começado a virar sem controle. Após isso a gravação revela um pequeno apito e os frenéticos esforços da tripulação para recuperar o controle.

Os resultados da investigação

Queda de avião

Assim foi como chegaram a conclusão de que Eldar foi o fator determinante na corrente de eventos e circunstâncias fatídicas. Os investigadores disseram que isto não teria ocorrido em um avião de fabricação russa, e que aparentemente a tripulação não se deu conta do detalhe.

Depois da catástrofe aérea do voo 593 foram revisados e regulamentados todos os protocolos relativos às pessoas que podiam ficar em uma cabine. Ademais, todos os vôos passaram a ser dotados de alarmes visuais e sonoros que possam avisar quando o piloto automático é desligado, ainda que seja de maneira parcial.

O Misterioso Desaparecimento do Boeing da Varig PP-VLU

Desaparecimento do PP-VLU da Varig

Introdução

Um avião a jato sobrevoa o Oceano Pacífico em uma viagem de rotina realizada à noite. Sem qualquer sinal de aviso, ele para de se comunicar com a torre e desaparece sem deixar rastros. Nos dias seguintes as operações de busca não conseguem encontrar qualquer destroço.

O Boeing da Varig foi visto pela última vez em 30 de janeiro de 1979, logo após decolar de Tóquio, no Japão, com destino ao Rio de Janeiro. Até hoje o caso é considerado um dos maiores mistérios da aviação brasileira.




Dados iniciais sobre o acidente

Data: 30/01/1979
Hora: ?
Tipo da aeronave: Boeing 707-323C
Empresa aérea: Varig
Prefixo: PP-VLU
Número de série: 19235/519
Primeiro voo: 26.08.1966
Motores: 4 Pratt & Whitney JT3D-3B
Danos na aeronave: Desaparecida (presume-se perda total)
Voo: 026
Natureza do voo: transporte de carga
Tripulantes: 6
Passageiros: sem passageiros
Fatalidades: 6 (desaparecidos e nunca encontrados. Presumem-se mortos)
Partida: Aeroporto Internacional de Narita (NRT/RJAA), Tóquio, Japão
Destino: Aeroporto Internacional do Galeão (GIG/SBGL), Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Local do acidente: Sobre o Oceano Pacífico, em local indeterminado

O avião PP-VLU

O PP-VLU foi adquirido pela Varig da American Airlines em 31.08.1966, onde portava a matrícula N7562A.

Acidente da Varig

O PP-VLU ainda sob as cores da American Airlines, sob prefixo N7562A, no Aeroporto de Filadélfia, nos EUA Foto: Polaneczky Bob (jetphotos.net)

Desaparecimento do Avião Cargueiro da Varig


A tripulação do PP-VLU

A tripulação do Boeing 707 Cargo era formada por seis homens:

• Comandante Gilberto Araújo da Silva, piloto;
• Comandante Erni Peixoto Mylius, 1º oficial;
• 2º oficial Antonio Brasileiro da Silva Neto; copiloto;
• 2.º oficial Evan Braga Saunders, copiloto;
• José Severino Gusmão de Araújo, mecânico de voo;
• Nícola Exposito, mecânico de voo.

Acidente e Desastre Aéreo do PP-VLU

Este foi também um dos raríssimos casos da aviação comercial mundial em que um piloto, o Comandante Gilberto, se envolveu em dois desastres aéreos com vítimas fatais. No anterior, o mesmo comandante sobrevivente do Voo Varig RG-820, que foi obrigado a fazer um pouso de emergência nas proximidades do Aeroporto de Orly, na França, em 1973, por um incêndio a bordo que matou 123 pessoas.

Seis meses depois do acidente, as famílias dos tripulantes receberam atestados de óbitos.

O voo 697 do PP-VLU

Avião Desaparecido

Na noite de 30 de janeiro de 1979, o avião cargueiro Boeing 707 da brasileira Varig partiu do aeroporto de Narita, em Tóquio, rumo a Los Angeles.

Seis pessoas viajavam no avião, que transportava uma carga de 20 toneladas, entre ela estavam dezenas de quadros do pintor nipo-brasileiro Manabu Mabe (1924-1997), que acabara de exibi-los em uma exposição no Japão.

O comandante do voo era Gilberto Araújo da Silva, de 54 anos, um veterano da companhia, com 23.000 horas de voo. Ele era uma celebridade no meio da aviação, por ter comandado o trágico voo RG820 da Varig, que se incendiou em pleno ar em 1973 quando ia do Rio a Paris. Na ocasião, Araújo conseguiu fazer uma aterrissagem de emergência em um terreno nos arredores de Paris, evitando que o avião pudesse cair sobre áreas habitadas e salvando outros nove tripulantes e um passageiro (outros 123 ocupantes morreram, quase todos por sufocamento causado pela fumaça das chamas).

No caso do voo 967, Araújo deveria comandar a aeronave até uma escala em Los Angeles, onde a tripulação seria trocada. A partir daí o avião prosseguiria para o Rio de Janeiro. Até lá, além de Araújo, viajariam o piloto Erny Peixoto Myllius, os co-pilotos Antônio Brasileiro da Silva Neto e Evan Braga Saunders e os engenheiros de voo Nicola Espósito e Severino Gusmão Araújo.

O último contato com a torre de Tóquio ocorreu 22 minutos depois da decolagem. Depois,só houve silêncio. Um segundo contato previsto para uma hora depois do início do voo nunca ocorreu.

As buscas prosseguiram pelos oito dias seguintes, sem sucesso. Acionadas, forças japonesas e norte-americanas realizaram as buscas por meses, mas a aeronave jamais foi encontrada.

Trata-se, provavelmente, do maior mistério da aviação brasileira.

O piloto herói do Varig 697

Acidente Varig 697

Gilberto Araújo era detentor da Ordem do Mérito Aeronáutico e também fora condecorado na França pela manobra que realizou no subúrbio de Paris, em julho de 1973, quando pilotava outro Boeing 707. Na ocasião, o avião se aproximava de seu destino, o aeroporto de Orly. Mas com a aeronave em chamas, o comandante decidiu realizar o pouso em uma plantação para evitar um desastre maior.

O fogo havia surgido em um banheiro e se espalhado pelo material plástico que revestia internamente o avião. Cento e vinte e três passageiros morreram asfixiados, entre eles o senador Filinto Miller e o cantor Agostinho dos Santos. Só 11 pessoas sobreviveram.

O piloto sofreu ferimentos na cabeça e na coluna, fraturou duas vértebras e o maxilar. Ficou internado por 17 dias em Paris. Só voltou a pilotar em janeiro de 1974.

Em 31 de janeiro de 1979, a manchete que o jornal Folha de S.Paulo estampava em sua capa reconhecia a fama de Araújo: "Piloto herói de Orly desaparece no Pacífico com Boeing da Varig".

"Era um comandante muito experiente. Se não fosse ele [em Orly], poderia ter sido muito pior", afirma o comandante aposentado Zoroastro Ferreira Lima Filho, 83, colega de Araújo nos tempos da Varig.

Obras de arte a bordo

O avião decolou de Tóquio transportando 53 quadros do artista nipo-brasileiro Manabu Mabe. Avaliadas à época em US$ 1,2 milhão, as obras haviam sido expostas no Japão.

Cada tela tinha um seguro de US$ 10 mil, valor considerado abaixo do mercado pelo artista. O Boeing transportava as pinturas para o Rio de Janeiro. Outra tripulação assumiria a aeronave em Los Angeles.

Além das obras de arte, o avião carregava material eletrônico, aparelhos elétricos, peças para navios, peças para computadores, máquinas de costura, entre outros objetos. A carga pesava 20 toneladas.

Manabu Mabe desastre Varig
Manabu Mabe (1924-1997) - Foto: Reprodução
Manabu Mabe, havia realizado uma grande exposição retrospectiva no Kumamoto Museum of Art, Kamakura Museum of Art e no National Museum of Art, em Osaka. A exposição foi um sucesso. Mabe ficou mudo quando seu secretário Yutaka Sanematsu o informou que os quadros da exposição tinham sido embarcados no voo da Varig que havia desaparecido.

O cargueiro 707 da Varig, partira de Narita, com o destino a Los Angeles e, em seguida, ao Brasil, transportando as obras mais importantes de sua carreira, sendo a maioria de sua propriedade, porém, cerca de 20 delas pertencentes a coleções de museus e particulares.

Foram perdidas cerca de 53 obras, entre elas as premiadas na V Bienal de São Paulo, “Pedaço de Luz” (abaixo), as obras da Bienal de Jovens de Paris, “Profeta I” e as da Bienal de Veneza. Além destas obras, expressivos trabalhos realizados no inicio de sua carreira também desapareceram.

Desastre Varig

Queda de avião Varig

Passado o impacto, Mabe entrou em contato com os proprietários das obras desaparecidas, com exceção de um proprietário, todos foram solidários e disseram que não queriam dinheiro e sim uma outra obra. Sendo assim, o artista prometeu a si mesmo que viveria mais trinta anos e pintaria tudo o que havia perdido.

Teorias sobre o desaparecimento do Boeing 707 da Varig


Os investigadores concluíram na época que a aeronave caiu no Oceano Pacífico aproximadamente 45 minutos após a decolagem devido a uma despressurização. Contudo, como sempre acontece nesses casos, várias teorias da conspiração foram formuladas para tentar explicar o sumiço do voo 967. Uma hipótese levantada foi a de sequestro a mando de colecionadores de arte, pois a aeronave transportava obras valiosas no porão.

Contudo, nenhum dos quadros apareceu até hoje. Outra teoria foi a de que o Boeing teria sido abatido pelos soviéticos por supostamente estar transportando um caça russo MiG-25 da Força Aérea Soviética, que havia deserdado da base de Saharovka e pousado no aeroporto internacional de Hokkaido, no Japão, em 1976 (foto abaixo).

Há, ainda, quem afirme que, ao sobrevoar a costa da Rússia, o avião teria sido forçado a aterrissar e a tripulação tenha sido assassinada.

Mistério avião da Varig


E, evidentemente, também existem as hipóteses de que a aeronave foi abduzida por extraterrestres ou atravessou um portal para outra dimensão.

Entretanto, entre as teorias mais plausíveis está a de que, após o avião da Varig alcançar a altitude de cruzeiro, a despressurização da cabine teria sufocado a tripulação. Assim, eles teriam voado durante horas com o piloto automático até a aeronave ficar sem combustível e despencar em algum lugar muito distante das áreas nas quais as buscas foram conduzidas.

O Boeing 707 da Varig Desaparecido


O Boeing 707 foi um dos primeiros aviões comerciais a jato. Foi produzido pela Boeing, que com esse modelo, passou a ser a maior fabricante de aviões comerciais do mundo.

Acidente Varig
Este é o primeiro Boeing 367-80 (Dash 80) que foi o protótipo para o que se tornou o KC-135 e o Boeing 707 Foto: Boeing
Até a década de 1950, a Boeing era uma fabricante sem muito expressão, entre as muitas existentes nos Estados Unidos. Era conhecida apenas por suas aeronaves militares, e na verdade, o 707 nasceu como um projeto de nave de reabastecimento, conhecida como KC-135A.

O Boeing 707 foi o primeiro a ter grande sucesso de vendas, bem como a primeira aeronave série 7X7 da Boeing. O seu principal concorrente era o Douglas DC-8 da ex-maior fabricantes de aviões comerciais, a Douglas.

O DC-8 se mostrou um formidável concorrente, porém o Boeing 707 vendeu mais de mil unidades, vencendo a disputa entre as duas fabricantes.

Desastre e Tragédia na Varig


O 707 é um quadrijato, possuindo dois motores sob cada asa. A primeira linha aérea a operá-lo foi a Pan Am, realizando a rota Nova Iorque - Paris, em 26 de outubro de 1958.

O alcance do Boeing 707 é de aproximadamente 5.700 mn (10659 km), velocidade de cruzeiro de 815 km/h, e a capacidade de passageiros, de até 202 pessoas. O Boeing 737, o Boeing 727 e o Boeing 747 utilizaram muito da tecnologia do seu antecessor, e podem ser consideradas como descendentes diretos dele.

A produção do 707 começou em 1954 e terminou em 1978, embora as versões de uso militar tenham continuado em produção até 1991. A Boeing fabricou um total de 1.012 unidades do avião.

O Boeing 707-300, foi a versão de maior sucesso, com melhorias e novos motores.

Repercussão na imprensa: Fotos e Vídeos





Notícias Boeing queda
Varig PP-VLU desaparecido

Varig PP-VLU desaparecido

Varig PP-VLU desaparecido


Fontes de pesquisa:
http://www.desastresaereos.net/historia_08_Varig_967_desaparecimento.htm
O Globo / Veja / ASN / Mega Curioso / UOL Notícias / Camisas & Manias / Wikipédia / Hangar do Vinna

Morte no gelo - Vnukovo 2801 (Relato Blackbox do Jetsite)

Relato Blackbox do Jetsite

A Vnukovo Airlines é uma das muitas companhias aéreas surgidas do desmembramento da antiga Aeroflot, a companhia estatal soviética. Baseada no aeroporto homônimo que serve à capital russa, a empresa cresceu rápido após sua fundação. Talvez, e apesar de seu sucesso, tenha crescido rápido demais, sobretudo no tocante à segurança aérea. A companhia, em sua curta trajetória, sofreu mais acidentes do que seria admissível. Um dos mais impressionantes é este que você vai ler a seguir, e que derrubou o voo VKO 2801.




Na madrugada de 29 de agosto de 1996, o Tupolev Tu-154M, prefixo RA-85621, partiu do aeroporto de Vnukovo com destino ao aeroporto de Svalbard - Longyear. A bordo iam mineiros, alguns com suas famílias, trabalhar nas minas que ficam na própria região de Svalbard, na ilha de Spitsbergen, Noruega. Até o início da aproximação ao aeroporto de Longyear, a viagem transcorreu absolutamente normal. A informação obtida pelo ATIS dava conta das condições atmosféricas na chegada: pista em uso 28, vento 230 com 100 nós, visibilidade de mais de 10 km, chuvas esparsas e muitas nuvens: poucas a 1.500 pés, esparsas a 2.000 pés; temperatura de 5ºC e QNH 1005 hPa.

A tripulação solicitou o pouso na pista 10 por duas vezes, mas o inglês deficiente dos pilotos impediu que a mensagem fosse entendida com clareza. As 08h15, a tripulação entrou numa curva base, saindo da mesma na proa 160. As 08h15, a aeronave iniciou uma curva para a proa 300, conforme descrito na carta de aproximação por instrumentos. A distância DME nesse momento era de 25.9 km da cabeceira, mas a aeronave já havia se desviado do alinhamento da pista em mais de 3.7 km para a esquerda. As 08h18, o primeiro alarme de proximidade com o solo soou. O co-piloto assumiu o comando e desativou o controle de pitch no piloto automático, que se manteve ligado, porém, no controle de rolagem. Nesse momento, a confusão instalou-se: o comandante do voo entregou a responsabilidade de identificação de posição ao navegador, que seguia as cartas Jeppesen, sem contudo ter autoridade -nem certeza para determinar as proas corretas. Na prática, o Tupolev voava numa linha paralela à reta final, quase 4km à direita de onde deveria estar. As 08h22:05, a aeronave começou a curvar à esquerda e perder altitude. Quase instantaneamente, porém, começou a sofrer os efeitos de ventos convectivos, gerados pelas montanhas que, sem perceber e enxergar à frente, o Tupolev começava a sobrevoar perigosamente perto. Então, o alarme GPWS soou. Restavam apenas poucos segundos para os ocupantes do Vnukovo 2801. Vamos entrar na cabine do Tupolev em seus minutos finais, mostrando a total desorientação e falta de trabalho de equipe que reinavam no cockpit. Os diálogos não deixam dúvidas.

Desastre do Vnukovo 2801

Cap: Comandante.
F/O: Primeiro Oficial
F/E: Engenheiro de Vôo.
NAV: Navegador.
???: Voz de tripulante não identificada.
AFIS: Centro de controle de Longyear
-RDO: Transmissão para o controle por parte de um tripulante.

8h16:55 - NAV: Sete milhas agora.
8h17:05 - F/O: Onde, onde é que estamos?
8h17:06 - NAV: Enquanto isso, prossiga assim mesmo.
8h17:08 - Cap: Reparou no lugar?
8h17:09 - NAV: No través de onde precisamos iniciar a curva.
8h17:14 - Cap: Vamos ter de fazer uma curva para corrigir a trajetória?
8h17:16 - ???: Estamos nos aproximando.
8h17:21 - Cap: Então, onde estaremos?
8h17:40 - AFIS: Vnukovo 2801, chame quando estiver a oito milhas.

8h17:43 Nesse instante, começa a soar, por seis segundos, o alarme de altitude.

8h17:44 - NAV-RDO: Chamarei a dez milhas, Vnukovo 2801.
8h17:55 - AFIS: Vnukovo 2801, chame quando estiver a OITO milhas.
8h17:57 - F/E: Ele disse oito milhas.
8h17:58 - NAV-RDO: Ah, chamarei a oito milhas, Vnukovo 2801.
8h17:59 - AFIS: Correto.

8h18:16 - Soa novamente, por três segundos, o alarme de altitude.

8h18:17 - F/E: Estamos livres para descer?
8h18:19 - F/O: Perdi a indicação no meu instrumento!

8:18:21 Volta a soar, por seis segundos, o alarme de altitude.

8h18:28 - Cap: Vou girar um pouquinho para a esquerda.
8h18:32 - F/O: Ahn, siga direto, em frente.
8h18:52 - Cap: Bom, devo manter?
8h19:03 - ???: Então, quais as ordens?
8h19:04 - Cap: Então?
8h19:06 - F/O: Será que giramos a curva base muito cedo?
8h19:11 - Cap: Vamos nivelar!
8h19:14 - Cap: Deveria estar à nossa direita.
8h19:16 - NAV: (referindo-se a interceptação do localizador): Espere que já vamos encontrar.
8h19:18 - NAV: (ainda referindo-se ao localizador): Está mais à direita?
8h19:19 - F/O: Não, está imóvel. (a indicação no instrumento)
8h19:20 - Cap: À direita!
8h19:22 - Cap: Vamos virar à direita! Me dê a carta de aproximação, Borya. (nome do navegador)

8h19:21 - Volta a soar, por seis segundos, o alarme de altitude.

8h19:22 - F/O: Temos que iniciar a descida aqui?
8h19:24 - Cap: Temos que descer!
8h19:30 - F/O: Temos que iniciar a aproximação?
8h19:32 - Cap: Temos que mergulhar!
8h19:34 - Cap: Que proa você está mantendo?
8h19:36 - NAV: Proa 300 graus.
8h19:51 - NAV: Mas aqui indica proa 014 graus!
8h19:52 - Cap: Então corrija!
8h19:51 - NAV: Então vou manter 320 aqui, ok?
8h20:14 - F/O: Não é pouco para corrigir?
8h20:15 - NAV: É só uma curva de correção.
8h20:17 - Cap: Não! Vire à esquerda!
8h20:20 - NAV: Treze milhas, vamos descer?
8h20:24 - F/O: Para a esquerda!
8h20:24 - NAV: Três graus por cinco minutos e entraremos na rampa de planeio.
8h20:29 - F/O: Já estamos na proa da final, certo?
8h20:33 - Cap: Para entrar na final, você precisa fazer uma curva mais para a esquerda.
8h20:44 - F/O: Flaps?
8h20:52 - F/O: Vinte e oito?
8h20:58 - NAV: Ahn, duas, duas. três milhas.
8h21:00 - Cap: Você nos guia, ok, você nos guia!
8h21:03 - NAV: Estamos seguindo (as cartas de navegação) Jeppesen.
8h21:22 - Cap: Qual a nossa radial?
8h21:03 - NAV: Vamos seguir nossa carta de aproximação até o final!
8h21:35 - F/O: Proa 300 até agora! Tá certo isso?
8h21:36 - NAV: Estamos voando no 1150. Muito alto, temos de descer.
8h21:41 - Cap: Temos de descer.
8h21:44 - Cap: Então?
8h21:47 - F/O: Como está nossa aproximação? Está correta ou não? Desço os trens?
8h21:51 - Cap: Trens pra baixo.
8h21:55 - F/O: Para a esquerda agora?
8h22:05 - Cap: Para a direita.
8h22:07 - F/O: Como estamos em relação à altitude?
8h22:09 - NAV: Estamos com 300, ahn, cinco metros. Descer!

8h22:17 - Soa mais uma vez, por seis segundos, o alarme de altitude do GPWS. O co-piloto aplica potência aos motores e levanta o nariz do jato, mas já é tarde demais. Em meio às nuvens, surge na frente dos quatro tripulantes um paredão de pedra.

8h22:22 - Cap: Horizonte!
8h22:23 - F/O: Montanhas!!!

As palavras do primeiro oficial são gritadas sobre o som do alarme de altitude. Fica registrado nesse instante, na caixa-preta, o primeiro som de impacto da aeronave com as rochas. No segundo seguinte, terminam a gravação e as vidas dos 141 ocupantes do Tupolev. O Tupolev colidiu com o topo da montanha Operafjellet a 7.7 milhas náuticas (14.2 km) do aeroporto, a uma altitude de 2.975 pés (907m), e a 3.7 km à direita do eixo da pista. Pela severidade do impacto e subsequente desintegração da aeronave, não poderia haver sobreviventes.

Três segundos depois, o controle de solo, sem saber do impacto, chama o vôo 2801, dando as instruções meteorológicas no aeroporto:

8h22:25 - AFIS: Vnukovo 2801, vento 231 com 17 nós, visibilidade superior a 10 milhas, chuva leve, nuvens isoladas a 900 pés e esparsas a 2000.

Cinco segundos depois, a torre chama mais uma vez o vôo:

8h22:30 - AFIS: Vnukovo 2801, você copiou minha última transmissão?

Já não havia ninguém para responder. A tripulação e todos os ocupantes do Tupolev não poderiam mais responder à transmissão alguma. No topo da montanha, o que se via era a completa destruição do jato. Nada menos que 18 fatores foram identificados como contribuintes ao desastre: planejamento, de planejamento inadequado a deficiente interação entre os membros da tripulação; do inglês insuficiente para as transmissões à deficiências gritantes de navegação. Dessas 18 falhas, nasceu outra tragédia que enlutou, mais uma vez, a aviação russa.

Fotos e Informações do Vnukovo

Air Disaster Vnukovo 2801

Desastre com Vnukovo 2801

Air Disaster Vnukovo 2801

Desastre com Vnukovo 2801

Air Disaster Vnukovo 2801

Desastre com Vnukovo 2801

Desastre com Vnukovo 2801

Air Disaster Vnukovo 2801

Desastre com Vnukovo 2801


https://en.wikipedia.org/wiki/Vnukovo_Airlines_Flight_2801

Fonte: Este relato foi extraído do extinto site Jetsite, do grande Gianfranco "Panda" Beting, da seção Blackbox, com fins de não se deixar perder o conteúdo daquele fabuloso site, nossa principal fonte de referência no mundo da aviação nos anos 2000. O texto é do Panda, algumas fotos e vídeos colocamos a parte, para contribuir com mais dados e informações.

AF 447: Abrindo a Caixa Preta

Relato do Acidente da Air France

O trágico desaparecimento do voo 447 da Air France, ocorrido em 1º de junho de 2009, continua assombrando o mundo da aviação. Como é possível imaginar a queda, em pleno Oceano Atlântico, de uma aeronave moderna, operada por uma companhia aérea de grande reputação, durante a fase de voo mais "serena" - em cruzeiro? Ainda assim, estes fatores somados não foram suficientes para evitar a perda do Airbus A330 e de seus 228 ocupantes. A tragédia teve ainda maior impacto em nosso país, pois foi do aeroporto do Galeão / Tom Jobim que o voo 447 decolou para a eternidade.




Nos meses seguintes, um processo intensivo de busca das "caixas pretas" deu-se a mais de 3.000 metros de profundidades. Somente quando os gravadores de voz e dados foram encontrados, em abril de 2011, é que o gigantesco e macabro quebra-cabeças começou a ser elucidado. E, ainda que a investigação definitiva não tenha sido publicada, o Jetsite traz agora a transcrição do conteúdo do CVR e do FDR.

A divulgação de parte do conteúdo foi feita no mês seguinte pela BEA - Bureau d'Enquetes et d'Analyses - o órgão do governo francês que investiga e promove a segurança no transporte aéreo daquele país.

Um quadro ainda mais extenso acabou sendo conhecido quando foi publicado na França um livro com a transcrição completa do acidente: a obra, intitulada "Erreurs de Pilotage - Volume 5", escrita pelo autor e piloto Jean-Pierre Otelli, já leva à uma conclusão, atestada pelo próprio título do livro. Ainda assim, é bom lembrar que acidente nenhum ocorre por um fator isolado. O que causa uma tragédia aérea é um sequência nefasta de ocorrências, descuidos, fatalidades.

Neste caso, o A330 penetrou em um forte sistema climático, uma tempestade tropical de notável força na região equatorial. Os tubos pitot congelaram, o piloto automático desligou-se, os computadores de bordo perderam a capacidade de controlar a nave e, ao mesmo tempo, fornecer dados confiáveis aos pilotos. Ainda assim, a obra e as investigações, neste caso, não culpam o fabricante dos tubos pitot, a fabricante do avião, a operadora Air France ou os controladores de tráfego. A responsabilidade é colocada diretamente sobre a tripulação e especificamente sobre os ombros de um único tripulante. Certo? Errado? Tire você mesmo suas conclusões.

Na noite de 31 de maio de 2009, o voo AF 447 deixou o aeroporto Tom Jobim com destino a Paris as 19h29. A aeronave era um Airbus A330-200, matrícula F-GZCP. Tinhas 18.870 horas totais e 2.644 voos (ciclos). A bordo iam 228 ocupantes, sendo 12 deles tripulantes. A primeira parte do voo transcorreu em absoluta normalidade. Pesava ao partir 232.800 kg, ou seja, realmente no limite de seu peso máximo de decolagem (MTOW de 233.000kg). O peso de todos os ocupantes somados era de 17.615 kg, sendo 126 homens, 82 mulheres, sete crianças e um bebê. No peso total, 70.400 kg eram combustível, assim calculado: 63.900kg para a viagem, 1.460 para desvios em rota, 2.200kg de reserva final, 1.900kg para alternar na chegada ao destino e 940 kg de combustível adicional.

O jantar foi servido e retirado. Os passageiros em sua maioria, procuraram dormir durante a parte noturna do voo, afinal, horas depois, todos chegariam sãos e salvos à Cidade Luz, já no período do final da manhã. Aqueles poucos que não conseguiam dormir, assistiam a filmes nos monitores individuais. A bordo, a cabine estava escura e a movimentação era mínima.

A 1h36, o voo penetra na zona da tempestade tropical. Contrariamente à todos os aviões atravessando aquela zona, os pilotos do AF 447 não solicitaram desvio na rota, optando por atravessar diretamente a zona de turbulência. Voando a 35.000 pés, o Airbus entra em meio às nuvens formadas na tempestade, e começa a sacudir. A 1h51, o cockpit começa a ser iluminado por luzes que se propagam nas janelas frontais como descargas mágicas. O fenômeno assusta o relativamente pouco experiente Primeiro Oficial, Pierre-Cédric Bonin, de apenas 32 anos e 807 horas no A330, que é quem ocupa a poltrona da direita. Pierre pergunta ao comandante Marc Dubois: "O que é isto?"

Dubois, um veterano de 58 anos, com 10.988 horas de voo, sendo 1.747 como comandante do A330, lhe explica que aquilo é apenas uma aparição do famoso fogo de Santelmo, fenômeno relativamente frequente ao se penetrar em nuvens com aquelas características. O fenômeno nada mais é do que uma descarga eletroluminescente provocada pela ionização do ar num forte campo elétrico provocado pelas descargas elétricas, condição existente nas nuvens carregadas que o AF 447 atravessava naquele instante. Mesmo sendo chamado de fogo, é na realidade um tipo de plasma provocado por uma enorme diferença de potencial atmosférica.

São agora 2 horas da manhã. David Robert, outro Primeiro Oficial, retorna à cabine de comando depois de descansar por quase toda a primeira parte do voo. Com 37 anos de idade, Robert é bem mais experiente que Bonin, com 6.547 horas totais e 4.479 no A330. São 2h02 quando o comandante Dubois deixa o cockpit para descansar. Isto ocorre de forma regulamentar em voos longos como este, sem ferir quaisquer regras internacionais de navegação. Dubois passa a ocupar um dos dois leitos destinados a esta função, posicionados imediatamente atrás do cockpit. Hora de entrar dentro do cockpit do F-GZCP.

O Acidente com o Voo AF 447 da Air France


02h03:44 (Bonin) Bom, está aí a convergência inter-tropical. Entramos nela, está aqui, entre 'SALPU' e 'TASIL.' Sim, estamos bem no meio dela. (N.E.: 'SALPU' e 'TASIL' são "waypoints", pontos imaginários criados para auxiliar na navegação.
02h05:55 (Robert) Ok, vamos chamar o pessoal lá atrás, é bom eles saberem.
02h06:04 (Bonin) Marilyn, é o Pierre aqui da frente... Em mais 2 minutos, vamos entrar em uma área que vai dar uma sacudida aí, mais forte. É bom você saber e cuidar aí da cabine.
02h06:13 (FA Marilyn) Ok, precisaremos nos sentar?
02h:06:15 (Bonin) Não seria má ideia. Avise os companheiros aí de trás.
02h06:18 (FA Marilyn) Ok, vou avisar. Muito obrigado!
02h06:19 (Bonin) Eu aviso assim que melhorar.
02h06:20 (FA Marilyn) Ok.

Os dois primeiro oficiais discutem a temperatura externa, mais quente do que o previsto, e que não permitiu a eles que subissem para uma altitude maior. E comentam também que é melhor estarem voando em um A330, pois este tem performance superior ao A340.

02h06:50 (Bonin) Ok, vamos ligar o anti-icing system. É melhor do que nada.
02h07:00 (Bonin) Parece que estamos no limite das nuvens, acho que estará tudo certo.

Enquanto isto, o F/O Robert examina as condições meteorológicas em seu radar e descobre que o mesmo não estava configurado para a correta detecção do sistema climático que haviam penetrado. Robert percebe que o A330 logo entraria em uma zona de intensa atividade climática e, percebendo que um desvio seria recomendável, decide avisar seu colega, que é quem esta pilotando o jato.

02h08:03 (Robert) Melhor curvar um pouco à esquerda.
02h08:05 (Bonin) Perdão, o que foi?
02h08:07 (Robert) Melhor curvar um pouco à esquerda. Estamos de acordo que estamos no manual, não?

Bonin inicia a curva à esquerda. Bonin avisa que vai reduzir a velocidade e pergunta a Robert se precisa ligar o anti-icing nos motores. Neste momento, um alarme soa na cabine por 2.2 segundos, indicando a desativação do piloto automático. Os três tubos pitot, entupidos com cristais de gelo, já não fornecem dados básicos como velocidade para os computadores que até então controlavam o voo do Airbus. Os pilotos teriam que voar o avião manualmente.

02h10:06 (Bonin) Tenho os controles.
02h10:07 (Robert) Okay.

Os vários acontecimentos nos últimos minutos parecem surtir um efeito na capacidade de julgamento de Bonin. O gelo, a descoberta do sistema de tempestade bem à frente, o fogo de Santelmo, a troca de comando... Bonin começa a reagir de forma irracional. Ele puxa o side stick para si e o Airbus começa a subir abruptamente, a despeito do piloto saber que, devido ao peso da aeronave naquele instante e à temperatura externa mais elevada, o jato não poderia subir de forma segura e sustentável.

O computador do jato reage a este comando inesperado e abrupto e imediatamente soa na cabine o alarme de estol (stall warning). Este alarme voltaria a soar 74 vezes nos minutos seguintes. Bonin, puxando para trás o sidestick, está efetivamente fazendo aquilo que não se deve fazer quando uma aeronave encontra-se em estol ou no limiar de um estol: puxar o nariz para cima. Surpreso, seu colega pergunta:

02h10:07 (Robert) O que é isto?
02h10:15 (Bonin) Não há uma boa... Não há uma boa indicação de velocidade.
02h10:16 (Robert) Nós perdemos a... A... As velocidades, então?

A aeronave está agora subindo a nada menos que 7.000 pés por minuto. E, ainda que ganhe altitude, ela vai perdendo velocidade até chegar a meros 93 nós. Robert percebe o erro de Bonin e trata de avisá-lo.

02h10:27 (Robert) Preste atenção à velocidade! Preste atenção à velocidade!
02h10:28 (Bonin) OK, OK, vou descer!
02h10:30 (Robert) Estabilize...
02h10:31 (Bonin) Ok!
02h10:31 (Robert) Desça, desça... Tá indicando que ainda estamos subindo, então desça!
02h10:35 (Bonin) Certo!

Com o sistema de anti-icing atuando, o aquecimento derrete o gelo e um dos tubos pitot volta a funcionar. Os displays na cabine voltam a fornecer informações corretas de velocidade.

02h10:36 (Robert) Desça!
02h10:37 (Bonin) Sim, aí vamos, estamos descendo.
02h10:38 (Robert) Calma, vai devagar!

Bonin reduz a pressão no side stick, reduzindo o ângulo de subida - mas, ainda assim, subindo. A velocidade é recuperada e sobe para 223 nós. O alarme de stall warning se cala. Por um momento, os pilotos parecem ter recobrado o controle da situação.

02h10:41(Bonin) Nós estamos, é, nós ainda estamos em "climb".

De fato, Bonin ainda não abaixou ou, ao menos, nivelou o nariz do avião. Robert resolve chamar ao cockpit o comandante Marc Dubois.

02h10:49 (Robert) Maldição, onde está ele?

Neste ponto, o Airbus já subiu mais de 2.500 pés acima de sua altitude quando a situação saiu da rotina. Por razões desconhecidas, Bonin volta a puxar o side stick para si, aumentando o ângulo de subida e colocando a aeronave novamente em condição de estol. Soa novamente no cockpit o alarme de estol.

O fato é que, desde o momento em que os tubos pitot se congelaram, os computadores do Airbus saíram de seu regime normal de atuação ("normal law" para o regime "alternate law," um programa que permite maior atuação dos pilotos e que inibe os sistemas de proteção ao voo encontrados no regime "normal law"). Neste regime, os computadores de jatos Airbus "assumem" a pilotagem e, na prática, impedem o avião de entrar em estol. Já, quando o sistema está no regime "alternate law", a realidade é que os pilotos podem, eventualmente, estolar a aeronave.

É absolutamente provável que Bonin não soubesse disto e, portanto, nunca tivesse voado no regime "alternate law". Portanto, pode-se inferir que ele desconhecesse as características de pilotagem em situações como esta. Pode ser que Bonin tenha assumido que a aeronave simplesmente não poderia estolar, pois isto é ensinado a todo piloto de Airbus: o sistema de voo protegerá o avião de um estol. O que talvez Bonin não soubesse eram a s diferenças de atuação dos computadores nos regimes "normal law" e "alternate law".

02h10:55 (Robert) Maldição!

O segundo tubo pitot volta a funcionar normalmente. Os aviônicos agora trabalham sem restrições. Os pilotos dispõem de todas as informações necessárias para voar seguramente. Daqui para a frente, o fator contribuinte para esta tragédia passa a ser um só: erro humano.

02h11:03 (Bonin) Estou em TOGA, hem?

TOGA é o acrônimo para "Take Off, Go Around", ou seja, máxima potência dos motores. Bonin, ao afirmar isto, dá a clara indicação que está tentando aumentar a potência e ganhar altitude, ou seja, deter a queda. O problema é que ele voa neste momento a 37.500 pés, com o ar rarefeito e sustentação muito menor. Os motores produzem menor potência nesta altitude e assim, menor sustentação. Levantar o nariz, a esta altitude, ao invés de fazer o avião ganhar altitude, produzirá o efeito contrário se a aeronave estolar.

Ainda que a reação de Bonin pareça irracional, ela se coaduna com o cenário de um indivíduo vivenciando um estresse severo. Em condições assim, as partes do cérebro que comandam a criatividade são desligadas; o indivíduo aferra-se àquilo que já experimentou e aprendeu em seu treinamento. Ainda que os pilotos sejam capacitados a voar manualmente suas aeronaves, o padrão é que isto seja feito a baixa altitude. Não é de surpreender, portanto, que, em meio à tempestade, sem referência visuais externas, Bonin tenha tentado voar o Airbus como se estivesse próximo ao solo, aplicando potência máxima e puxando mais uma vez o nariz para cima. Enquanto isto, Robert tenta chamar pelo interfone o comandante Marc Dubois de volta ao cockpit.

02h11:06 (Robert) Diabos, ele vem ou não vem?

O Airbus agora atinge sua máxima altitude. Motores a plena potência, nariz em ângulo de ataque de 18 graus acima do horizonte (o mesmo ângulo empregado em uma decolagem normal), o enorme jato voa por alguns segundos na horizontal e então começa sua vertiginosa queda. Alarmado, Robert reage quando o jato inicia a queda.

02h11:21 (Robert) Ainda temos potência! O que acontece neste puteiro? Não entendo o que está acontecendo!

Diferentemente de um jato da Boeing, os side sticks nos jatos da Airbus podem ser movidos de forma independente. "Se um piloto no lado direito está puxando, o piloto no lado esquerdo não sente isto em seu joystick" ensina o Dr. David Esser, professor na escola de aviação Embry-Riddle. Desta maneira, Robert simplesmente não tem ideia de que, a despeito de suas ordens e das conversas trocadas, Bonin permaneceu praticamente todo o tempo puxando para si o seu side stick.

Os dois Primeiro Oficiais estão perdendo a batalha contra a pilotagem do jato por não aderirem aos preceitos básicos de algo que é ensinado a todo piloto; o conceito de CRM, ou crew resource management. Essencialmente, eles não estão conseguindo cooperar. Não está claro quem comanda e quem é comandado, quem executa e quem dirige as ordens. Isto pode ocorrer quando há dois profissionais de mesmo ranking na cabine, seja dois comandantes ou dois Primeiro Oficiais. Enquanto isto, Bonin segue puxando totalmente para si o side stick. Com o nariz elevado, o Airbus despenca em meio às nuvens, chacoalhando fortemente em função da turbulência externa e do estol em que se encontra.

Na cabine de passageiros, a sensação deve ter sido extremamente desagradável. A queda do avião faz com que os ocupantes tenham a desagradável sensação de leveza provocada pela queda. O ruído dos motores ao máximo e a trepidação excessiva foram sentidos e certamente foram suficientes para acordar e amedrontar todos os ocupantes. A velocidade vertical aumenta na medida que o Airbus despenca. Se Bonin tivesse largado os controles ou passado o comando a Robert, o Airbus teria seu nariz abaixado e a situação ainda poderia ser revertida. Bonin se desespera.

02h11:32 (Bonin) maldição! Perdi o controle totalmente! Perdi o controle totalmente!
02h11:37 (Robert) Comandos à esquerda!

Finalmente, Robert, o mais sênior dos pilotos na cabine assume a pilotagem. Infelizmente, a impressão que se tem é que ele também não compreende que o Airbus está de fato estolando, e instintivamente puxa para si o seu side stick. Ainda que o nariz esteja apontado para cima, o Airbus despenca a um ângulo de 40 graus em relação ao horizonte. O barulho ensurdecedor do alarme de "stall warning" continua a soar. Bonin, depois de uma breve pausa, volta a puxar o side stick para si. Neste momento, transcorridos apenas 91 segundos do início da crise, o comandante Dubois retorna à cabine, perplexo.

02h11:43 (Dubois) Eeee! Que diabos vocês estão fazendo?
02h11:45 (Bonin) Nós perdemos o controle do avião!
02h11:47 (Robert) Nós perdemos totalmente o controle do avião! Não entendo nada o que está acontecendo! Tentamos de tudo!
02h11:52 - (Dubois) Então peguem os comandos logo!

Neste momento, o Airbus passa pela marca de 35.000 pés com apenas 100 nós de velocidade horizontal, nariz para cima em 15 graus e descendo a mais de 10.000 pés por minuto, em ângulo de 41.5 graus - uma atitude que seria mantida, com pequenas variações, até o impacto com o oceano. E ainda que os tubos pitot estejam agora perfeitamente funcionais, a velocidade horizontal é tão baixa - agora abaixo de 60 nós - que as indicações de ângulo de ataque são consideradas inválidas. O alarme de estol silencia-se, contribuindo para a impressão dos pilotos que, de fato, os computadores do avião estão fornecendo indicações espúrias e, que, portanto, o avião não estaria mesmo estiolando - quando de fato está. E como.

O comandante Dubois opta por ficar na poltrona central, de observador. Ele não tenta ocupar sua poltrona na esquerda, talvez pela dificuldade de se locomover enquanto o jato despenca rumo ao mar. Não lhe ocorre perguntar quem está comandando o voo. Dubois tenta apenas compreender o que teria levado o Airbus a se comportar assim, sem questionar ou ordenar o básico: que um dos pilotos efetivamente "voe" o avião.

02h12:14 (Robert) O que você acha? O que você acha? O que devemos fazer?
02h12:15 (Dubois) Bem, eu não sei! Está descendo!

Volta a soar o alarme de estol, mas nenhum dos pilotos comenta sobre isto. Eles passam a discutir qual seria a origem da perda de controle. Dubois ordena a Bonin que mantenha as asas niveladas. E os três passam a discutir abertamente se o avião estaria de fato caindo ou subindo, ainda que os instrumentos mostrasse isto claramente. Ao se aproximar da altitude de 10.000 pés, Robert tenta retomar o comando e empurra o seu side stick para a frente, tentando abaixar o nariz do jato. Mas, como Bonin permanece puxando para si o side stick no lado direito, o avião entra na situação de "comando duplo" (dual input). O sistema de computadores obedece os comandos de Bonin, mantendo o nariz elevado e o Airbus em queda livre.

02h12:26 (Robert) A velocidade?
02h12:27 (Robert) Você está subindo. Você está caindo, caindo, caindo!
02h12:30 (Bonin) Mas eu estou caindo?
02h12:42 (Bonin) Quanto subimos?
02h12:44 (Dubois) Não é possível!
02h12:45 (Robert) Como está a altitude?
02h12:52 (Bonin) Estamos caindo ou não?
02h13:01 (Robert) Agora você está caindo!
02h13:04 (Dubois) Coloque as asas na horizontal!
02h13:07 (Bonin) É o que estou tentando fazer!
02h13:09 (Dubois) Coloque as asas na horizontal!
02h13:25 (Bonin) O que está havendo... Por que nós continuamos caindo?
02h13:32 (Bonin) Vamos passar pela marca de 10 mil pés!
02h13:36 (Bonin) Nove mil pés!
02h13:40 (Robert) Suba! Suba! Suba! Suba!
02h13:40 (Bonin) Mas eu estou com o side stick puxado o tempo todo!

Finalmente, Bonin conta aos colegas o fator crucial que selaria a sorte de todos a bordo. Neste momento, intervêm a experiência do comandante Dubois.

02h13:42 (Dubois) Não, não, não... Não suba! Não, não!
02h13:43 (Robert) Então desça! Me passe os controles! Me passe os controles!

Bonin finalmente cede os controles e Robert finalmente abaixo o nariz da aeronave. O jato começa a ganhar velocidade horizontal, mas ainda mergulha rumo ao mar à razão de 10.000 pés por minuto. Ao chegar a apenas 2.000 pés sobre a superfície do oceano, um novo alarme soa na cabine: é o GPWS, Ground Proximity Warning System, que indica que o Airbus aproxima-se perigosamente do oceano. Não há mais chance de recuperação para o voo 447. Por incrível que possa parecer, Bonin mais uma vez agarra seu side stick e mais uma vez o puxa completamente para si, colocando novamente o Airbus na situação de "comando duplo" (dual input).

02h14:05 (Dubois) Atenção, você está subindo!
02h14:07 (Robert) Estou subindo?
02h14:07 (Bonin) É o que nós devemos fazer, estamos a 4 mil pés!
02h14:18 (Dubois) Então puxe!
02h14:21 (Bonin) Puxa, puxa, puxa, puxa!
02h14:23 (Robert) Maldição, nós vamos cair! Não posso acreditar nisso!
02h14:25 (Bonin) O que está acontecendo?
02h14:27 (Dubois) Dez graus de elevação!

Exatamente 1.4 segundos depois, o cockpit voice recorder pára de funcionar. Os ocupantes do voo 447 têm morte instantânea quando o enorme A330 colide violentamente contra o Oceano Atlântico. No momento do impacto, a razão de descida era de 10,912 pés por minuto; a velocidade horizontal era de apenas 107 nós, a atitude era de 16.2 graus "nose-up", a asa esquerda estava 5.3 graus abaixo da linha do horizonte e a proa era de 270 graus.

Investigação do Acidente AF 447 da Air France

Depois de transcritas a caixa preta e analisado o FDR, de posse dos primeiros dados enviados ainda naquela fatídica noite, a aviação mundial nunca mais seria a mesma. Muitas lições foram dolorosamente aprendidas com a tragédia do Air France 447. Pilotos comerciais em todo o mundo deverão agir de forma diferente quando confrontados com um alarme de estol em alta altitude. Companhias aéreas vão modificar seus treinamentos, incluindo alguns dos ensinamentos aprendidos neste caso. Entre os quais, é bom destacar: atenção total às condições climáticas e ao uso do radar; melhoria nos procedimentos de CRM, sobretudo quando houver apenas dois Primeiro-Oficiais no cockpit; maior compreensão e disseminação do que ocorre quando um jato da Airbus passa a ser operado em regime de alternate law; praticar as técnicas de pilotagem manual em voo de cruzeiro.

Este acidente também explicita uma tendência crescente: a crescente "fé" dos aeronautas na capacidade "infalível" de suas máquinas, cada vez mais automatizadas. Ainda que centenas de acidentes tenham de fato sido evitados, nos últimos anos, pela incrível capacidade de automação dos aviões comerciais, é preciso lembrar que é o último e preponderante elemento na cadeia de segurança: o homem.

É fácil criticar a atuação dos aeronautas da Air France do conforto de uma poltrona, na cama de seu lar. Mas quem seria capaz de se colocar na posição de infalível" quando confrontado com a mesma situação experimentada pela tripulação do AF447: uma tempestade em uma noite escura, 12 km acima do oceano, com indicações espúrias nos instrumentos - afirmar: "eu teria me salvado".

Quem poderia atirar a primeira pedra, se a companhia seguiu todos os procedimentos mundialmente aprovados? Operar voos longos como este com tripulação composta (1 comandante e 2 Primeiro-Oficiais) é de fato procedimento legal, ainda que muitas empresas optem por tripulação de revezamento (2 comandantes e 2 Primeiro-Oficiais) em jornadas comparáveis. Em retrospecto, é fácil pensar: e se ao menos um comandante estivesse sempre aos controles? Talvez a inexperiência de Bonin não se mostrasse catastrófica. Certamente a decisão de não desviar da tempestade, contrariamente ao que fizeram todos os outros aviões que por ela passaram naquela noite, tenha sido o fator que precipitou a cadeia de eventos que levou o AF 447 ao seu túmulo sob as ondas. Mas ainda assim, ele poderia ter sido salvo nos minutos seguintes. Aí, entra um componente que não está escrito em manual algum. Entrou, de forma definitiva, a mão pesada e invisível do destino.

Fotos, Vídeos e Informações do Acidente AF 447 da Air France (RJ e Paris)





Desastre Rio de Janeiro Paris AF 447

Acidente Air France AF 447

Desastre Rio de Janeiro Paris AF 447

Desastre Rio de Janeiro Paris AF 447

Acidente Air France AF 447

Desastre Rio de Janeiro Paris AF 447

Desastre Rio de Janeiro Paris AF 447

Acidente Air France AF 447

Desastre Rio de Janeiro Paris AF 447



http://www.avioesemusicas.com/air-france-447-e-o-relatorio-final.html

https://oglobo.globo.com/rio/voo-447-relatorio-final-da-tragedia-aponta-combinacao-de-erros-humanos-tecnicos-5396719

http://g1.globo.com/mundo/noticia/2014/05/acidente-da-air-france-foi-causado-por-reacao-inapropriada-da-tripulacao.html

https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2012/07/10/passageiros-do-af-447-nao-tiveram-consciencia-da-queda-do-aviao-confirma-relatorio-da-justica-francesa.htm

https://pt.wikipedia.org/wiki/Voo_Air_France_447

Fonte: Este relato foi extraído do extinto site Jetsite, do grande Gianfranco "Panda" Beting, da seção Blackbox, com fins de não se deixar perder o conteúdo daquele fabuloso site, nossa principal fonte de referência no mundo da aviação nos anos 2000. O texto é do Panda, algumas fotos e vídeos colocamos a parte, para contribuir com mais dados e informações.

Golden Falcon down! A Tragédia do Eastern 375

Relato de tragédia aérea da Blackbox do Jetsite

A tarde de terça-feira, 4 de outubro de 1960, ia chegando ao fim. Um sol maravilhoso fazia deste um dos últimos dias quentes de outono e banhava o aeroporto de Logan, que serve esta histórica cidade do noroeste dos Estados Unidos e está localizado em meio à região alagadiça da baía de Winthrop. Com uma temperatura na casa de perfeitos 22 graus e nenhuma nuvem no céu, aquele era um dia simplesmente perfeito para voar. Somente com o final da tarde se aproximando - o por do sol seria as 18h21 - é que uma leve brisa marítima começava a deixar o ar mais um pouquinho mais fresco.




Passava pouco das 17h15 quando a família Abate decidiu subir para o terraço do aeroporto. Minutos antes, haviam se despedido de seu filho Frederick, 18 anos, que embarcaria no voo 375 da Eastern. O jovem havia se recrutado no exército e esta seria a viagem que o levaria para o quartel de Parris Island, Carolina do Sul, onde iria iniciar seus treinamentos. Junto com ele, viajavam outros 14 recrutas, todos da região de Boston, embarcando em uma nova etapa em suas vidas.

Os Abate, ao chegar no terraço notaram, para sua surpresa, que eram os únicos na extensa área reservada à observação de aviões. Naquela época, todo aeroporto tinha um terraço aberto. A aviação ainda encantava a todos e era vista como uma profissão nobre e desejável. Família inteiras passavam os fins de semana a acompanhar o movimento de aeronaves desde os saudosos "terracinhos" em todo o mundo e o aeroporto de Logan não era exceção.

A mãe de Freddie ficou satisfeita ao perceber que o avião que levaria seu filho estava posicionado bem em frente ao terminal. Estacionado perfeitamente de lado em relação ao terraço, era possível acompanhar de camarote o processo de embarque. Naquela tarde, o voo 375 era operado por um novíssimo Lockheed L-188 Electra. As escalas programadas eram Filadélfia; Charlotte, na Carolina do Norte; Greenville, na Carolina do Sul e finalmente Atlanta, Geórgia. Matriculada N5533, aquela era uma aeronave nova. Entregue pelo fabricante em 8/6/1959, contava com apenas 3.561 horas de voo e havia voado por apenas 5 horas após passar por uma completa revisão. E, ainda que os Electra contassem com uma péssima reputação nos Estados Unidos, em função de quatro acidentes graves enfrentados desde sua introdução em serviço em 1959, aquela aeronave era um avião moderníssimo para os padrões da época. Alem de avançado, era veloz, confortável e, depois de extensas modificações no projeto original, incorporadas após descobertas as causas de dois destes desastres, era uma aeronave segura sim senhor.

Tragédia no Voo 375 da Eastern
Lockheed L-188 Electra da Eastern

Para os Abate, que não tinham ligação maior com aviação, aquele era apenas o "avião do Freddie", a aeronave que iria levar o filho mais velho para os braços de Tio Sam. Como tantos jovens daquela geração, Freddie sentia que era preciso servir às Forças Armadas de seu país, à época metido até o pescoço na Guerra Fria contra a União Soviética.

O jovem e magricelo recruta, trajando uniforme militar, foi o último a embarcar no Electra, depois de ter ajudado uma anciã a subir a bordo, por uma das duas escadas telescópicas e embutidas na fuselagem, que o Electra trazia como equipamento padrão. Elas eram acionadas eletricamente e, uma vez dobradas, recolhiam-se sob as portas principais. Esta solução permitia ao Electra servir aeroportos pequenos, com poucos recursos de apoio de solo, e eram extremamente populares entre as companhias aéreas.

As portas foram finalmente fechadas e a família Abate concentrou-se em tentar avistar o jovem Frederick Nino Abate, seu nome completo de batismo. Para satisfação de sua mãe, Freddie sentou-se em uma das poltronas nas janelas. Seu rosto magro e sorridente agora era perfeitamente visível desde o terraço, graças às enormes janelas que eram um das marcas registradas dos Electra. Pat Connelly, sua jovem namorada, não escondia suas lágrimas. Trocaram acenos de despedida. Não poderiam imaginar que aquela seria de fato, a última despedida.

Tragédia do Voo 375 da Eastern

Passava pouco das 17h30 quando o comandante Curtis W. Fitts, um dos mais experientes profissionais da Eastern, iniciou o processo de girar motores. Fitts, 59 anos, mais de 23 mil horas de voo e 1.100 delas passadas no comando do Electra, era um piloto natural. Calmo, comprovadamente muito capaz, era estimado e respeitado por seus pares. Naquela tarde, a tripulação do voo 375 era completada pelo primeiro oficial Martin J. Colloway, igualmente tarimbado, e pelo engenheiro de voo Malcolm Hall, outro profissional respeitado pelos colegas. A cuidar dos 67 passageiros, duas jovens comissárias: Joan Berry 23 anos, e Patrícia Davies, 22 anos. Eles levariam o Electra por toda a costa leste, de norte a sul, até o destino final, Atlanta. Mais um voo corriqueiro para este time de profissionais, todos eles nascidos e criados no sul e sudeste dos Estados Unidos.

Os motores Allison 501 D-13 de número 3 e 4, ambos na asa direita, foram os primeiros a serem acionados. Com os dois motores girando normalmente, os equipamentos de solo (gerador de energia e compressor de ar) finalmente foram desconectados, permitindo que os motores 1 e 2, postados na asa esquerda, ganhassem vida.

Eram 17h33. Na cabine, o comandante Fitts acionou o microfone e chamou o controle, com uma frase curta e direta:

EA 375 Cap: Torre, Eastern 375, IFR para Filadélfia.

O controle de solo respondeu:

Solo BOS: Eastern 375, liberado para Filadélfia, pista 09, vento sudoeste com 10 nós.

Após liberar o táxi de um voo da TWA, o controlador da frequência de solo instruiu o Eastern 375 a passar para a frequência da torre de controle.

As 17h35, com as rotações dos motores estabilizadas, o comandante Fitts desligou o freio de estacionamento e empurrou levemente os manetes adiante, iniciando o táxi. A enorme potencia dos quatro Allison, mesmo em regime de marcha lenta, já era capaz de movimentar o Electra pelo pátio. O quadrimotor saiu fazendo uma curva a direita, levando seus 72 ocupantes (cinco tripulantes e sessenta e sete passageiros) rumo à pista 9. Naquela operação, a aeronave pesava pouco mais de 44.450 kg, bem abaixo do peso máximo de decolagem do tipo, certificado para decolar com 51.260kg. Deste total, 11.290kg eram combustível.

Autorizado a prosseguir para a cabeceira 09, após decolar o Eastern 375 deveria prosseguir no rumo leste e voaria por cerca de dois minutos nesta proa até 3 mil pés. Então iniciaria uma curva de quase 150 graus e voaria na proa sudoeste, ideal para chegar a Filadélfia, distante 450km de Boston, onde chegaria depois de 90 minutos de voo.

O Electra ia chegando próximo à cabeceira da pista 9 e o comandante Fitts informou pelo rádio que estava pronto para decolar. A torre respondeu que ele procedesse até a cabeceira e aguardasse alinhado no eixo da pista.

Naquele momento, havia pouco tráfego. Um par de caças F-86 Sabre havia partido minutos antes, seus motores a jato puro ainda trovejando na tarde cristalina. Logo depois, havia sido a vez do TWA decolar. Um Aero Commander voava na perna base para pouso na pista 09, o que levou o controle a autorizar o voo 375 para partir sem perda de tempo.

BOS TWR: Eastern 375, autorizado decolagem imediata, pista 9.

O comandante Fitts não perdeu tempo e simplesmente comunicou ao controle:

EA 375 Cap: Eastern 375, rolando.

Eram 17h39. Esta seria a última comunicação do Electra com a torre. E as últimas palavras gravadas de Curtis W. Fitts.

Naquele exato instante, desde o terraço, a família Abate acompanhava a gradual aceleração do Electra, que ia ganhando velocidade e levando consigo seu amado filho mais velho. A mãe de Freddie, particularmente, não desgrudava os olhos daquele avião azul, branco, vermelho e dourado, ostentando a elaboradíssima pintura da Eastern, tão comum à época.

O sol já estava bastante próximo do horizonte e despejava sua luz dourada bem por trás do Electra, praticamente no alinhamento da pista 09. Era como se um produtor de cinema tivesse sido encarregado com a missão de posicionar o sol na localização ideal para que os pilotos do Eastern 375 pudessem ver perfeitamente a pista e os arredores do aeroporto de Logan. Portanto, a condição de visibilidade, naquela tarde de ar diáfano, era absolutamente perfeita: nada menos que 15 milhas.

A Sra. Abate observava atentamente a partida do Electra, em meio aos acenos, risos e piadas de seus familiares. Afinal, "aquele" avião estava tirando o "seu" Freddie dela. Coração de mãe é sempre diferente e sabe e percebe coisas insondáveis. Em estado de atenção absoluta, a emoção tomou conta dela. Era a primeira vez que Freddie voava, que viajava sozinho, que se ausentaria da família por período prolongado e, ainda mais, alistando-se no serviço militar. Que mãe não ficaria emocionada com todos estes acontecimentos ocorrendo simultaneamente?

Depois de percorrer aproximadamente 800 metros de pista, o Electra ultrapassou sua V-R de 139 nós e o comandante Fitts puxou suavemente o manche. O quadrimotor da Lockheed ganhou os ares normalmente e a seguir, Fitts comandou o recolhimento dos trens.

Neste momento, os olhos fixos de da mãe de Freddie notaram algo diferente: uma pequena nuvem de fumaça branca, como um "puff", desprendendo-se de um dos motores. Uma chama brilhante surgiu e apagou-se rapidamente, aparentemente próxima dos motores. Então surgiu outra chama, seguida de ruídos que pareciam pequenas explosões, que começaram a pipocar em rápida sucessão, originários de ambos os motores da asa esquerda. O Electra agora deixava nitidamente um espesso rastro de fumaça preta, ao mesmo tempo que começava a balançar as asas, voando de forma nitidamente instável.

A Sra. Abate, paralisada pela cena, permaneceu com os olhos vidrados, a respiração suspensa. Aquilo não poderia ser normal. E não era mesmo. O Electra começou flagrantemente a perder altitude, ao mesmo tempo que seu nariz subia para cima da linha do horizonte, de forma súbita e grotesca. A asa direita desceu repentinamente, o nariz do Electra ergue-se ainda mais. Num rápido movimento, a asa direita ergue-se, passou do linha do horizonte e então foi a vez da asa esquerda afundar. A seguir, a aeronave executou uma reversão, virando de dorso, seu nariz apontado verticalmente para as águas da baía Winthrop. As 17h40, apenas setenta e três segundos apos a liberação dos freios na cabeceira da pista 09, o nariz do Electra N5533 colidiu violentamente com a água, em um ponto onde a profundidade era de apenas 10 metros. A fuselagem, caindo sobre si mesma, enterrou-se de modo telescópico no leito do oceano. Foi uma pancada devastadora, a ponto de cavar uma cratera de 3 metros de profundidade no leito lamacento da baía.

No terraço do aeroporto de Logan, os Abate ficaram completamente mudos, atônitos, incrédulos com o que acabavam de presenciar. O ruído dos quatro motores do Electra cessara por completo. Um silêncio quase absoluto, surreal, tomava conta do aeroporto. Os risos, os gritos de adeus, as brincadeiras que até segundos antes animavam o espírito da família Abate, passaram inicialmente do silêncio absoluto do choque e, então, ao soluçar do pranto dos pais, irmãos, amigos e da namorada de Frederick Nino Abate.

Este silêncio mortal logo seria interrompido pelo alarido de dezenas de sirenes e buzinas dos caminhões de resgate e de combate ao fogo, que acorreram para a cabeceira oposta e lá ficaram imóveis, inicialmente acompanhando, impotentes, a dramática cena no meio da baía: destroços flutuantes, uma enorme parte da cauda, ainda flutuando, e uma imensa mancha de combustível e óleo que se formava e marcava o ponto onde o Electra e seus 72 ocupantes agora se encontravam.

Desde sua aeronave que circulava ao campo para pousar, os ocupantes do Aero Commander puderam acompanhar todo o drama do voo 375. Logo chamaram a torre para comunicar o que haviam acabado de testemunhar:

17h41: Aero Commander: Torre Logan! O Electra acaba de cair na água!

Um longo silêncio seguiu-se, até que a torre respondeu.

BOS TWR: Sim, nós vimos. Já acionamos o equipamento de emergência.

O resgate do Voo Eastern 375

As dezenas de testemunhas, ainda que tenham visto de ângulo diferentes, tivessem idades, nível de experiência e conhecimento sobre aviação totalmente díspares, concordaram em um ponto fundamental: a severidade da colisão coma água. O Electra mergulhou invertido, praticamente na vertical, levantando uma enorme coluna de água. Seria praticamente impossível encontrar alguém vivo em circunstâncias como aquela. Mas, para a surpresa de todos, segundos depois do impacto com o oceano, tão logo a violenta e enorme coluna de água provocada pela queda dissipou-se, as dezenas de testemunhas posicionadas nas casas, barcos, ancoradouros e ruas próximas à baía Winthrop começaram a ver algo tão inesperado quanto surpreendente: cabeças e troncos dos ocupantes do Electra começaram a ser visíveis entre as partes do avião que ainda flutuavam. Aumentando ainda mais a surpresa e agora aflição, algumas destas pessoas começaram a acenar e gritar por socorro. Havia sobreviventes!

Imediatamente, dezenas de pessoas colocaram-se em ação, por livre e espontânea vontade. Tomaram o que tivessem às mãos, barcos, botes infláveis, lanchas, até um veleiro e zarparam a toda velocidade rumo ao local da queda. Os primeiros a chegar encontraram uma cena devastadora. Entre a enorme mancha de óleo e querosene, corpos e pedaços de corpos começavam a flutuar entre partes da aeronave. E, milagrosamente, alguns passageiros agarravam-se aos destroços, ou debatiam-se na água, pedindo por socorro. Dentre os sobreviventes, as duas comissárias, Patrícia e Joan, debatiam-se para permanecer acima da combinação pegajosa e sufocante de óleo, querosene e fluido hidráulico que se misturavam sobre a água salgada provocavam sufocamento e irritação nas feridas expostas. Todos os sobreviventes resgatados apresentavam profundos cortes no rosto e sinais de traumatismo severo em suas cabeças. Quase todos sangravam abundantemente.

Os moradores da baía de Winthrop foram heroicos: atiraram-se nas águas geladas e ajudavam como podiam, tentando agarrar os sobreviventes e colocá-los a bordo de suas pequenas embarcações. No entanto, cobertos de óleo e combustível, muitas vezes não era possível segurá-los e trazê-los a bordo: eles simplesmente escorregavam das mãos de seus salvadores. Alguns tiveram que ser puxados por cordas até as margens, onde outros voluntários - socorristas, policiais e bombeiros - ofereceram os primeiros socorros.

A noite fechava-se rápido sobre a baía de Winthrop. Logo, a escuridão era um obstáculo adicional para prejudicar a desesperada busca por sobreviventes, daquele que foi o primeiro acidente fatal em Logan. Por volta da meia-noite, os trabalhos foram interrompidos. Já fazia muito tempo desde que algum sobrevivente havia sido resgatado. A tarefa agora era outra: encontrar os corpos da dezenas de mortos, muito dos quais jaziam presos às ferragens da fuselagem submersa.

A investigação da Tragédia com o Eastern 375

Na manhã seguinte, o trabalho de resgate de corpos e destroços foi reiniciado. Ao mesmo tempo, os investigadores retomaram a tomada de evidências. A pergunta que todos faziam era: o que teria acontecido de tão inesperado, tão trágico, para os infelizes ocupantes do Eastern 375, durante aqueles 73 segundos de voo?

A primeira pista conclusiva foi descoberta na manhã seguinte, quando o sol voltou a raiar sobre Boston. A pista 9, fechada desde o acidente, foi percorrida pelos investigadores. Para surpresa geral, próximo da intersecção com a pista 15, de onde haviam partido os F-86 Sabre - e aproximadamente no ponto onde o Electra começou a levantar o nariz - dezenas de carcaças mutiladas de pássaros foram encontradas.

Ornitólogos e especialistas forenses foram chamados e logo determinaram que, ainda que algumas das carcaças estivessem mortas há alguns dias, a maioria tinha ainda alimentos em seus estômagos, o que indica que haviam morrido minutos depois de se alimentar, certamente no dia da colisão. O quebra-cabeças começava a ser montado.

Outro fato que acabaria sendo determinado dizia respeito à hora da operação. No exato momento da decolagem do voo 375, por um capricho do destino, a maré atingiu seu ponto mais baixo, deixando expostas enormes áreas de mangue, ricas em vida e uma "praça de alimentação" por excelência para a fauna aviária. Com o dia chegando ao fim, aquela era a hora perfeita para milhares de pássaros fazerem sua refeição do dia antes de procurarem abrigo para passar a noite.

Com o constante movimento das marés, a região onde está situado o aeroporto é, portanto, um chamariz natural para as dezenas de espécies locais e um convidativo ponto de passagem para as espécies de aves migratórias. Para azar dos ocupantes do voo 375, dentre as aves que voavam na região, naquele exato instante, encontrava-se um enorme bando (depois estimado) entre 10 mil e 20 mil estorninhos.

Acidentes e Desastres Aéreos


O estorninho-comum (Sturnus vulgaris), é um pássaro da família dos esturnídeos, nativo da Eurásia e introduzido na América do Norte artificialmente, através da mão do homem. É de comportamento gregário e voa em bandos compactos, de até 80 mil indivíduos. Uma característica do voo em bando é que executam interessantes evoluções, mudando rapidamente de direção, tal como um cardume de peixes. Com frequência, após a época de reprodução, os estorninhos propiciam esse espetáculo tanto no campo como próximo das grandes cidades. E dos mais movimentados aeroportos.

Starling Eastern 375 Flight

Starling Eastern 375 Flight


Os investigadores começavam a apontar para o principal suspeito: a colisão do Electra com milhares de estorninhos. Faltava a prova cabal. Nas semanas seguintes, os quatro motores foram recuperados do fundo do mar. Exames baroscópicos de seus interiores comprovaram a causa do desastre: a ingestão pelas turbinas de dezenas de pássaros. Um Electra de 52 toneladas de peso havia sido derrubado por pássaros cujo peso individual mal passava de 75 gramas.

Os investigadores reconstituíram a sequência de acontecimentos. Tudo ocorreu de forma incrivelmente rápida. Com apenas vinte e seis segundos transcorridos desde o início da rolagem, e com apenas sete segundos desde que as rodas saíram do chã, um bando estimado entre 10 e 20 mil estorninhos que atravessava a pista naquele momento, cruzando o eixo da pista da esquerda para a direita, colidiu com o Electra. O enorme volume de pássaros ingeridos, fez com que as aves sugadas começassem a interromper o delicadíssimo balanço da entrada de ar com a injeção de combustível, bem como impactaram as palhetas das turbinas dos motores 1, 2 e 4 do Electra.

O motor número 1 foi o mais afetado pela ingestão de pássaros e deixou de gerar potência por completo. O número 2 perdeu potência por um período estimado entre 5 e 8 segundos. O motor número 3 falhou por dois segundos - pouco tempo, é certo, mas o suficiente para desligar o sistema elétrico e desligar sistemas vitais para a pilotagem do avião, inclusive o sistema de bombas hidráulicas que alimentavam o servo de assistência hidráulica de controle do manche (power steering). Fitts teve de usar apenas a força bruta para tentar equilibrar a errática atitude do avião. Para piorar a situação, quando o sistema voltou a funcionar, dois segundos depois, o resultado foi uma supercompensação da aeronave, desestabilizando-a ainda mais. Finalmente, o motor 4 falhou por um período estimado entre seis e oito segundos. Para complicar, logo depois, os motores 2, 3 e 4 voltaram a produzir praticamente 100% de potência, ou seja, o Electra acelerava em relação ao oceano. O motor 1 permaneceria apagado desde a ingestão dos pássaros. O sistema de embandeiramento automático dos hélices (auto-feather) entrou em operação conforme previsto, logo após a ingestão dos pássaros e conseqüente estol das turbinas.

Com a potência afetada de forma irregular, o quadrimotor não apenas perdeu empuxo como começou a enfrentar um quadro de desestabilização, conhecido como empuxo assimétrico. Com os dois motores do lado esquerdo mais comprometidos, o Electra começou a derrapar para este lado: a asa esquerda deixou de prover sustentação suficiente para a continuidade do voo. A aeronave chegou a atingir somente 285 pés de altitude, pouco mais de 86 metros sobre o solo, antes de começar a afundar em direção à baía de Winthrop.

Desprovido de caixas pretas - estes equipamentos ainda não eram obrigatórios àquela época - podemos apenas imaginar a tensão e a surpresa que tomou conta do comandante Fitts e de sua tripulação. O avião não acelerava mais, não mais ganhava altitude a agora uma de suas asas perdia sustentação. As testemunhas foram categóricas ao afirmar que notaram as tentativas do piloto em estabilizar o avião: as asas balançavam de um lado a outro. Sem obter potência para garantir a sustentação mínima, a velocidade do Electra despencou, até o ponto em que a aeronave entrou em estol, provocando uma manobra súbita e nada graciosa, uma mudança dramática de rumo e prumo. Tal como abruptas são as mudanças de trajetória de um bando de estorninhos.

Em uma fração de segundos, o nariz do Electra subiu pelo menos 15 graus acima da linha do horizonte. E depois, elevou-se ainda mais rapidamente, quando a velocidade horizontal chegou a zero. A asa esquerda deixou de sustentar a aeronave e despencou, fazendo com que o Electra virasse de dorso e mergulhasse rumo à baía. Sem praticamente nenhuma altitude em relação ao nível do mar (estima-se que neste ponto, o Electra estivesse apenas 40 metros acima da água), uma manobra de recuperação mostrou-se impossível.

Em depoimentos prestados aos investigadores nas semanas posteriores ao desastre, os membros da família Abate afirmaram que neste exato momento, desde o terraço puderam ver perfeitamente a parte superior do avião, na medida em que o nariz da aeronave agora apontava em direção à baía Winthrop.

As investigações comprovaram o quão demolidor foi o impacto com a água. A desaceleração instantânea provocou uma força de 60G, ou sessenta vezes a força da gravidade. A estrutura do avião simplesmente desintegrou-se em uma fração de segundo. Com exceção de dois, todos os assentos se desprenderam do piso da aeronave, amontoando-se na parte frontal do charuto da fuselagem e esmagando quase todos os ocupantes. Dos corpos que puderam ser resgatados, os patologistas diagnosticaram morte por politraumatismos ou, pior, por afogamento. O número de sobreviventes poderia ter sido muito maior se as poltronas não tivessem se desprendido de suas fixações no piso da cabine. A parte dianteira da fuselagem, esmigalhada, nada mais era do que um enorme emaranhado de fios, metal rasgado, cabos, dutos, poltronas, espuma, borracha e seres humanos - ou o que restava deles. Somados todos os fatores, a comissão de investigação determinou que aquele era um acidente sem chance de sobrevivência.

Até por esta razão, este viria a ser um acidente fadado a entrar para os anais da aviação. E por diversos motivos.

Em primeiro lugar, porque aquele era o primeiro grande acidente aéreo causado pelo perigo aviário - a colisão com aves. Não seria o último, nem potencialmente o mais devastador. Mas era certamente o primeiro grande acidente com vítimas fatais envolvendo uma aeronave comercial de grande porte nos Estados Unidos.

Em segundo lugar, porque, apesar do veredicto dos investigadores apontar para um acidente sem possibilidade de haver sobreviventes - classificado oficialmente como "non-survivable", nada menos que 10 ocupantes acabariam por sobreviver. Entre eles, as duas comissárias, Patrícia e Joan, e mais oito passageiros. O primeiro-oficial Martin Colloway chegou a ser resgatado com vida, mas morreu a bordo de uma dos barcos que participou do resgate.

Outro fator que tornou este acidente fundamental na história da aviação foi a análise feita pelo desprendimento das poltronas de suas fixações. Até esta época, os assentos eram certificados para suportar desacelerações de 6 a 9 G, ou de seis a nove vezes a força da gravidade. Com base no inquérito deste acidente, e de outros ocorridos com forte desaceleração, a indústria evoluiu para o padrão de segurança atual. Hoje, um novo avião só é certificado para transportar passageiros se suas poltronas suportarem uma desaceleração de 16G.

A questão que agora pairava era: teria havido inabilidade por parte da tripulação? O comandante Fitts, se tivesse agido de forma absolutamente irrepreensível teria salvado a sua vida e a dos ocupantes do Electra. Para responder a estas perguntas, o CAB reproduziu as condições do acidente em um Full Flight Simulator, o mais moderno do País àquela época. E convidou os 16 melhores pilotos de Electra dos Estados Unidos, depois e pedir às companhias aéreas que operavam o modelo colaboração nas investigações. Os 16 melhores pilotos foram levados a Miami, onde estava o simulador, e simplesmente submetidos à mesmíssima sequência de panes que sofrera o voo 375. Resultado: dos 16 pilotos testados, absolutamente nenhum conseguiu reverter a queda.

Tempos depois, mais precisamente em 26 de julho de 1962, o CAB divulgou o relatório final sobre o desastre do Eastern 375. Segundo o documento:

"A comissão determina que a causa provável deste acidente foi a seguinte: a severidade e provável ocorrência do acidente reside na única e critica sequência de eventos que ocorreram em rápida sucessão, após a ingestão de pássaros pelos motores, com consequente perda de potência, velocidade e controle durante a decolagem. A única chance seria a rápida equalização da potência nos motores e o abaixamento do nariz para recuperar a velocidade perdida - mas, devido à altitude extremamente baixa, entre 100 e 150 pés, uma recuperação seria praticamente impossível. Condições emergenciais de grande complexidade mostraram-se em um ambiente de rápida degradação nas condições de voo; a capacidade humana de percepção, reconhecimento, análise e reação à estas condições não ocorreu em velocidade suficiente para o restabelecimento de um desempenho positivo de controle da aeronave."

O fato é que naquele final de tarde, um preço elevadíssimo - 62 vidas - foi pago pela indústria da aviação comercial. A família Abate, bem como dezenas de outras, pessoalmente marcadas pela queda do "Golden Flacon Electra", bem sabem disto. Foram eles que tiveram a trágica experiência de ver seus entes queridos desaparecendo de forma súbita, trágica e difícil de aceitar.

Fotos e Informações da Tragédia do Voo Eastern 375


Eastern 375 Flight tragedy

Tragédia com voo 375 da Eastern

Eastern 375 Flight tragedy

Eastern 375 Flight tragedy

Eastern 375 Flight tragedy

https://en.wikipedia.org/wiki/Eastern_Air_Lines_Flight_375

Fonte: Este relato foi extraído do extinto site Jetsite, do grande Gianfranco "Panda" Beting, da seção Blackbox, com fins de não se deixar perder o conteúdo daquele fabuloso site, nossa principal fonte de referência no mundo da aviação nos anos 2000. O texto é do Panda, algumas fotos e vídeos colocamos a parte, para contribuir com mais dados e informações.