United 232 - Batalha Heróica no Voo UAL 232 (Blackbox do Jetsite)

Relato de Acidente da seção Blackbox do Jetsite

No dia 19 de julho de 1989, o comandante Alfred Haynes, 58 anos, despertou para cumprir mais um dia de trabalho. Com 37.000 horas de voo, Haynes não sabia que, antes daquele dia acabar, ele entraria para a história da aviação comercial. Sua profissão era, e ainda é, uma das poucas que provocam admiração generalizada. Pilotos de aviões são apontados nas ruas, clubes e condomínios. Famílias falam com orgulho quando têm um parente, mesmo distante, que seja "piloto de avião".



A admiração deve-se, sobretudo, a um fato que embora passe longe da verdade, provoca respeito em todo mundo: a ideia de que pilotos de aviação comercial arriscam a própria vida no cumprimento da função. A verdade é que pilotar um grande jato comercial hoje em dia é infinitamente mais seguro, por exemplo, do que conduzir ônibus, táxis ou até mesmo trens de metrô. Mas se a aviação conquistou esse invejável nível de segurança, o fez, em grande parte pela perícia e bravura de pilotos como Haynes. É o que você vai ver agora neste Blackbox, que mostra a impressionante façanha de Haynes e seus colegas de cabine no voo United 232.

Acidente com o United 232

Naquele dia, o voo UAL 232 partiu de Denver, então um dos mais importantes hubs da United, com destino à sede da empresa e sua base operacional mais relevante, Chicago. A bordo do DC-10-10 de prefixo N1819U, iam 296 passageiros, 8 comissários (as) e três tripulantes técnicos. O voo havia partido do Colorado sem qualquer anormalidade e prosseguiu assim até exatamente 15h16, quando, sem qualquer indicação prévia, o DC-10 experimentou uma tremenda explosão. O motor número dois, posicionado na cauda da aeronave, simplesmente desintegrou-se. Partes do motor ainda girando saíram em todas as direções, danificando a cauda do aparelho, cortando sua fuselagem, e pior, rompendo dutos dos três sistemas hidráulicos independentes e redundantes, responsáveis pela operação dos sistemas de controle do jato.

Numa fração de segundos, o DC-10 tornou-se praticamente incontrolável: não possuía mais leme, profundores, flaps ou slats que pudessem controlar seu vôo. Donde, a tripulação liderada por Haynes não podia fazer curvas, subir ou descer o nariz, uma asa, ou praticamente nenhum controle de forma confiável. A única condição para obter um nível limitadíssimo de controle era o de alternar a potência dos dois motores restantes, um em cada asa, de forma a girar o nariz para um lado ou para outro, e desta forma, tentar fazer curvas desajeitadas no ar. A redução da potências dos dois motores restantes também faria com que o DC-10 reduzisse sua altura, também de forma bastante elementar. Mal comparando, se antes Haynes pilotava um Cadillac, agora tinha nas mãos um carro de rolimã.

Do momento da explosão até o final do voo 232, passaram-se 41 minutos de terror para os passageiros e de muito trabalho e coragem para os tripulantes. O mais notável é que Haynes e seus colegas, em face do que os aguardava, mantiveram tranquilidade e até mesmo bom humor. Agora você vai entrar na cabine do United 232 e comprovar que a diferença entre a vida e a morte pode estar mesmo nas mãos de um time de bons profissionais.

Cap: Comandante Al Haynes
Cap-RDO: transmissão de rádio do comandante ao solo
F/O: primeiro-oficial
F/O-RDO: transmissão de rádio do primeiro-oficial
F/E: engenheiro de vôo
F/E-RDO: transmissão de rádio do engenheiro de vôo
Cap-2: Comandante extra (sentado no jump-seat)
Cap-3: Denny Fitch, comandante viajando como passageiro
SAM: System Aircraft Maintenance (freqüência de manutenção da United)
UAL: Despacho operacional da United em Chicago

Cap-RDO: Sioux City, estamos controlando a aeronave usando apenas os motores. Acho que não conseguimos fazer curvas para a esquerda. Parece que só conseguimos curvar à direita. Estamos iniciando uma curva leve à direita agora.
APP: Ah, United 232 Heavy, Sioux City, entendido não consegue fazer curvas para a esquerda. Parece que só consegue curvar à direita, entendido.
Cap-RDO: Afirmativo.
APP: Entendido, sua proa atual o coloca a oito milhas ao norte do aeroporto, senhor. E, ah, talvez consiga alinhar com a pista 31 se fizer uma leve curva à esquerda ou tentar aproximar-se com uma longa curva pela direita.
Cap-RDO: Ok. Girando à direita agora. Talvez consigamos pequenas curvas na reta final, mas por enquanto... Faremos curvas à direita para a proa que vocês determinarem.
APP: Ok, United 23 heavy, curva à direita, proa 255.
Cap-RDO: Dois cinco.
Cap: E agora o maldito profundor também não quer trabalhar. Rolando à direita.
F/E-RDO: SAM, aqui é o United 232. Nosso motor número dois explodiu e perdemos os sistemas hidráulicos. Só controlamos com assimetria de potência, ah, mantendo vôo nivelado. Nós perdemos o controle do leme e profundores.
F/O: Muito pouco controle de profundores. Estão muito duros ou travados ou sem autoridade alguma.
SAM: United 232, entendemos que vocês perderam o motor nº2 totalmente?
F/E-RDO: Afirmativo.
SAM: United 232, vocês ainda têm os sistemas hidráulicos 1 e 3 operando normalmente?
F/E-RDO: Negativo. Todos os três sistemas hidráulicos inoperantes. Os únicos itens que nos restam são... (O engenheiro elenca uma lista de sistemas e instrumentos que ainda estão em operação normal).
SAM: United 232, entendemos que vocês têm força normal nos motores nº1 e 3?
F/E-RDO: Afirmativo.
SAM: United 232, Toda a quantidade de fluido hidráulico perdida?
F/E-RDO: Sim, toda a pressão foi perdida. Olha, nós precisamos de assistência de vocês. Estamos tendo muita dificuldade em controlar o avião!
SAM: Ok, United 232. Ok, vamos tentar ajudá-los. Vamos revirar o manual do DC-10 e ver se ajudamos, ok?

Nesse instante, o comandante Haynes está concentrado em tentar obedecer as instruções de navegação informadas pelo centro de aproximação de Sioux City.
APP: United 232, consegue girar para a proa 240?
F/O-RDO: Vamos tentar, controle.
F/E: Deus, eu odiaria ter que mexer em alguma coisa por aqui.
Cap: É mas, não dá para ficar parado.
APP: United 232, informe POB (pessoas a bordo) e quantidade de combustível remanescente.
F/E-RDO: Temos 37.6 toneladas de combustível.
APP: Ok, entendido.
Cap: (dirigindo-se ao comandante extra) - Vá lá pra trás e veja como estamos. Dê uma olhada nas asas e veja como estamos.
Cap-2: Ok, vou lá ver como estamos.
Cap: Falou com o SAM (manutenção da United)?
F/E: Sim, falei.
Cap: O que eles estão dizendo?
F/E: Eles não disseram nada, não ajudaram nada.
Cap: Bom, amigos, não vamos conseguir chegar a pista nenhuma. Vamos ter que botar este avião no solo em algum lugar e esperar pelo melhor.

O comandante extra retorna a cabine e conta o que viu:

Cap-2: Nós estamos com os ailerons internos levantados. Só deu para ver isso.
Cap: Isso é porque estamos tentando ao máximo curvar agora. É por isso.
Cap-2: Me diga como posso ajudá-lo.
Cap: Perdemos o piloto-automático. Veja se você ajuda a ligá-lo.
Cap-2: Ok, vou tentar.
Cap: Manete da direita. Vamos manter o motor dois acelerado e reduzir o motor nº 1. Nós precisamos de controle nos profundores e não temos. E não sei como conseguir isso.
UAL: United 232, vocês querem pousar agora ou prosseguir para Chicago?
F/E-RDO: Olha, nós precisamos de todo apoio que vocês puderem dar. Falamos com o SAM e não obtivemos retorno. Nós perdemos tudo aqui. Não está fácil controlar e não sabemos mais o que fazer. Estamos a 17.000 pés e descendo. Nós, ah. Nós não temos praticamente mais nenhuma maneira de controlar o avião.
UAL: Ok, entendido, nós estamos contatando a base São Francisco para ver se eles ajudam. Para dar o máximo de ajuda a vocês agora mesmo.
F/E-RDO: Olha, não dá para chegar em Chicago. Nós vamos ter de pousar em algum descampado por aqui mesmo.
UAL: Ok, entendido.
Cap: Como estão preparativos lá atrás para um pouso forçado?
Cap-2: Estão cuidando disso, mas sem muita pressa.
Cap: É bom avisá-los para se apressar então. Não temos muito mais o que fazer aqui. Vamos ter de fazer um pouso forçado em algum lugar, muito em breve.
Cap-2: Tá bem, então.
Cap: É, não tem outro jeito. Não acho que consigamos chegar a algum aeroporto.
F/O: É, estamos com pressão hidráulica zero.

Neste momento, soa o alarme de trem de pouso não abaixado.

Cap: Vamos ter de descer isso (trem de pouso) de qualquer jeito.
F/O: Quer dar flaps agora?
Cap: Sim, pode dar flaps. Temos os slats?
Cap-2: Não.
Cap: Bom, que adianta? Não dá mais para piorar além disso. Comande os flaps. Bom, sem hidráulicos não vamos ter os flaps.
APP: United 232, consegue manter a presente proa?
Cap-RDO: Onde estamos em relação ao aeroporto, controle? Estamos voando em curvas.
APP: Bem na sua proa, a 36 milhas de distância.
Cap-RDO: ok, tentaremos ir numa linha reta, direto.
Cap: Assim que o nariz começar a subir, vamos ter de empurrar essas colunas de controle para a frente.
Cap-2: Não temos potência alguma no motor nº2?
Cap: Não, está desligado.
Cap: Precisamos manter uma proa de 300 agora. Nós agora só estamos conseguindo, mais ou menos, manter voo nivelado.
Cap-2: Com a ar mais denso, melhora a sustentação. O que temos é o que temos.
Cap: Está um pouco melhor. Não passei por nada parecido na minha última sessão de simulador (treinamento regular).

A tensão é quebrada. Todos riem dentro da cabine, apesar do fato aparente de que a aeronave, na melhor das hipóteses, enfrentará um pouso forçado.

Cap: Não, vamos lá. Vamos por este troço no chão. Não se preocupem.
F/O: Parece mais controlável agora, não, Al?
Cap-2: Sim, com o ar mais denso ele fica mais controlável. Nossas chances melhoram, não é?
Cap: Eu sei o que vou fazer. Vamos pousar em Sioux City. Vamos lá.
Cap-RDO: Sioux City, United 232. Você pode nos fornecer sua freqüência de ILS, rumo da pista e seu comprimento?
APP: United 232, afirmativo. Freqüência do localizador é 109.3 e vocês estão na presente a 35 milhas a noroeste do aeroporto. Proa para interceptar é. 240 para o localizador.
Cap-RDO: Ok, conseguimos algum controle agora. Qual o comprimento da pista?
APP: United 232, a pista tem 3.300 metros.
Cap-RDO: Ok, obrigado.

Nesse momento, o primeiro-oficial extra está controlando manualmente os dois manetes, sentado no jumpseat imediatamente atrás dos dois pilotos. A manutenção da United (SAM) ainda não é capaz de acreditar na perda quase total de controle, conseqüência direta da perda de todo fluido hidráulico, e ainda não deu ao voo 232 uma ajuda definitiva.

Cap: Vamos alijar combustível imediatamente. Temos que deixar o avião o mais leve possível. Acione o comando de alijamento acelerado.
F/E: Ah, certo, nem tive tempo de pensar em alijar combustível.
Cap: Tente não perder mais altitude, hem?
F/O: O que? Altitude?
Cap: É.
F/O: Ok, pode alijar o combustível.

Alguns instantes se passam enquanto o combustível é descartado por dois pontos especialmente dedicados a isso, no bordo de fuga das asas.

Cap-2: Ok, atingiu o peso, atingiu o peso, atingiu o peso. Faltam apenas uns mil quilos pra perder.
F/O: Ok.
Cap-2: Este desgraçado parece estar puxando mais para a direita, não?
APP: United 232, vocês informaram o número de ocupantes a bordo?
Cap-RDO: Olha, não tivemos tempo de checar isso, controle, não tivemos tempo de falar com as meninas lá atrás.
APP: Ok, entendido.
Cap: Retarde os manetes. Retarde. Está subindo.
Cap-2: Ok, retardando.
F/O: É, estamos subindo.
Cap: É, estou empurrando (a coluna de comando) com força total aqui.
Cap-2: Vou tentar colocar 90% de potência aqui, pra ver se vocês não precisam lutar contra esse pitch (ângulo do nariz da aeronave em relação ao horizonte).
F/O-RDO: Sioux City, United 232. Qual a nossa posição em relação ao aeroporto agora?
APP: United, vocês estão a 37 milhas, proa vinte graus.
Cap: Se você conseguir manter com os manetes uma curva de 10 a 15 graus.
Cap-2: OK, Vou ficar no controle, vou controlar, vou cuidar disso.
Cap: Você tinha conseguido nivelar as asas por um minuto.

Nesse instante, Denny Fitch, outro piloto da United que viajava no voo 232 como passageiro, entra na cabine de comando para oferecer ajuda. O comandante que até então ocupava a poltrona do jumpseat resolve então ceder seu lugar à Fitch.

Cap: Olá, meu nome é Al Haynes.
Cap-3: Oi, Al. Denny Fitch.
Cap: Como vai, Denny?
Cap-3: Eu te digo uma coisa: Vamos tomar uma cerveja juntos quando tudo isso terminar, ok?
Cap: Olha, eu não bebo, mas fica combinado. Depois dessa, vai valer a pena mesmo tomar uma.
Cap-3: Ok. Você perdeu um motor, não é?
Cap: Ele simplesmente explodiu, sem aviso. Não deu para fazer nada, a não ser desligá-lo.
Cap-3: Certo.
Cap: Olha, já pensamos em tudo aqui e não nos ocorreu nada que não tenhamos tentado. Não há, na verdade, nenhum procedimento para uma emergência como esta.
Cap-3: Olha, o que em algum momento terá de ser feito é abaixar os trens de pouso. Acho que isso vai servir também para abaixar o nariz.
APP: United, quando vocês conseguirem estabilizar na proa 240, o aeroporto estará alinhado com vocês a 38 milhas de distância.
F/O-RDO: Ok, estamos tentando controlar, mas não temos mais o sistema hidráulico e estamos fazendo curvas somente com a assimetria de potência. Estamos tentando fazer o melhor, mas não está fácil.
APP: Ok, já notificamos os equipamentos de emergência na área e estão todos esperando por vocês.

O comandante Haynes discute alguns detalhes como frequências e proas e chega à conclusão que é hora de iniciar a aproximação final. Uma comissária é chamada à cabine para receber também algumas instruções adicionais.

Cap: Ok, todos prontos?
Cap-3: Olha, qualquer velocidade acima de 210 vai resultar numa atitude de nariz para cima.
Cap: Olha, querida, vai ser duro, vai ser uma aterrissagem feia, difícil.
F/A: Ok, entendi. Nós vamos ter que evacuar a aeronave?
Cap: Sim. Vamos abaixar o trem.
F/A: Certo, entendi.
Cap: E se eu conseguir parar o avião com tudo em cima, nos dê uns dois segundos antes de iniciar a evacuação.
F/A: Entendido.
Cap: Quando chegar a hora, eu direi "segurem-se!" (em inglês, Brace) Esse será meu aviso de que chegou a hora. Vou falar pelo sistema de PA: Brace! Brace! Brace!
F/A: Vai ser essa a instrução para evacuar?
Cap: Não, essa vai ser a instrução para o pouso.
F/A: Ahã.
Cap: E então se você receber o sinal para evacuar você vai perceber, mas realmente duvido que a gente termine isso com as rodas todas no chão. Boa sorte, querida.
F/A: O... O... Obrigado, pra vocês também.

Trêmula, a comissária sai da cabine de comando e volta para instruir suas colegas do que deverá ser feito após o pouso.

F/E: A comissária me disse que parece haver algum tipo de estrago na asa, ela me disse. Não é melhor verificar isso?
Cap-3: Não dá mais tempo.
Cap: Ok, vá lá dar uma olhada, rápido.
Cap: Denny, não temos quase nenhum controle de profundores. Se ao menos tivéssemos um pouco, depois poderíamos nos preocupar em acertar a proa.

Todos riem na cabine, apesar da situação.

Cap: Vamos lá, vire um pouco, Denny.
Cap-3: Pra que lado?
Cap: Esquerda.
Cap-3: Esquerda.
Cap: Volte. Volte. Volte. Volte. Volte. Ahh, vamos ter que fazer mais uma curva então.
Cap-RDO: Ok, controle, vamos ter que fazer mais uma curva aqui. Nós temos um pouco mais de controle dos profundores, mas não conseguimos controlar as proas direito.
APP: United, os profundores estão funcionando o suficiente para garantir controle de altitude?
F/O: Muito pouco.
Cap-RDO: Negativo. Mas estamos um pouco melhor.
APP: Entendido.

O engenheiro retorna à cabine de comando e reporta o que viu:

F/E: Olha, dei uma olhada pelas janelas, os estabilizadores horizontais estão bastante avariados, isso deu para ver.
Cap: Bom, vamos descer mais um pouco agora, pessoal.
Cap-3: Ok, vou reduzir um pouco a potência.
Cap: Alguém têm alguma ideia de como abaixar o trem de pouso?
Cap-3: Por gravidade. Desde que as portas dos trens estejam abertas. Elas estão?
Cap: Estão.
F/O: E nós vamos ter problemas para frear também.
Cap: Ah, sim, não temos mais freios.
F/O: Nada de freios?
Cap: Alguma coisa, mas não muito.
Cap-3: Você só vai ter uma chance. Na hora de pisar nos pedais, pé. Esmague com tudo. Use toda a força. Você só vai ter essa chance. Bom, agora vamos virar e seguir para o aeroporto, ok?
Cap-RDO: Controle, vamos reiniciar uma curva de aproximação. Como não temos mais freios, sugiro que os equipamentos de emergência fiquem concentrados mais para o final da pista, ok? E independentemente do resultado do pouso, pelas condições da aeronave, nós vamos evacuá-la assim que pararmos. É melhor vocês avisarem as equipes de emergência disto, por favor.
APP: Ok, United 232. Se da presente vocês continuarem na proa 220, ela os levará direto para a cabeceira.
F/O-RDO: 220, entendido.
Cap-RDO: Qual o teto agora?
APP: Ah, teto é 4 mil pés, nuvens esparsas, visibilidade 15 milhas abaixo do teto.
Cap-RDO: Qual a elevação do aeroporto?
APP: 1098 pés (AGL).
F/O: Bom, a aproximadamente 5.000 pés deveremos estar visual. E, Al, se tivermos que usar os spoilers, também não teremos como, certo?
Cap: Acho que não. (dirigindo-se ao engenheiro de voo) E o que disse o SAM?
F/E: Nada, nada que pudesse nos ajudar.
Cap: Ok, esqueça eles. Diga a eles que vamos colocar esse avião no chão e saia da freqüência. Diga que você vai estar ocupado, deixe eles de lado, eles que se danem.
Cap-3: Qual a distância para o aeroporto?
Cap-RDO: Controle, qual a distância para o aeroporto?
APP: 35 milhas, se vocês continuarem essa curva para a esquerda, com mais quinze ou vinte graus, vocês estarão direto na proa do aeroporto.

Pelos minutos seguintes, os profissionais discutem a melhor maneira de abaixar o trem. Optam por liberar as travas e deixá-lo cair por gravidade. Depois de muitas discussões, usam este método, com sucesso.

Cap: Vamos lá.
F/E: Ok. ok. Temos três verdes! Trens baixados!
Cap: Ok, trave tudo o que puder, trave isso.
Cap-3: Ai, olha só, os slats estenderam.
Cap: Uma curvinha de nada para a direita. Não há muito o que fazer. Amarrem-se todos, vamos nós agora. (O cmte. Haynes solta um longo suspiro)
APP: United 232, você consegue fazer curvas à direita?
Cap-RDO: Sim, à direita sem problemas, à esquerda é que não dá.
APP: Entendido.
Cap: Bom, mamãezinha, agora vamos ver, agora vamos ver. Nós vamos logo saber se voltaremos a ver jogos de beisebol ou não.
F/O-RDO: por favor, onde está o aeroporto?
APP: 21 milhas, na sua proa.
Cap: 21 e mil pés, temos que nivelar agora.
APP: United 232, você terá de abrir a curva um pouco à esquerda, e ah, isso também irá evitar que vocês sobrevoem a cidade.
Cap-RDO: Seja o que for, nos mantenha longe da cidade.
Cap-3: Mantenha esse troço nivelado se você conseguir.
Cap: Nivelado, baby, nivelado, nivelado.
Cap-3: Mais, mais potência, mais, mais, mais.
F/O: Potência máxima!
Cap-3: Potência máxima!
APP: United 232 heavy, voe na proa 180, proa 180, proa uno-oito-zero.
Cap-RDO: Acho que não dá, mas vamos tentar.
APP: United 232, você está a 17 milhas a nordeste do aeroporto, vocês estão indo bem.
Cap-RDO: Vamos ter que curvar à direita para a proa 180.
Cap-3: Mantenha curva a direita, Al, mantenha curva a direita.
Cap: Temos que manter este desgraçado nivelado. Eu estava com medo de baixar os trens caso nós precisássemos fazer um pouso forçado.
APP: United 232, quão fechadas podem ser suas curvas?
Cap-RDO: Aproximadamente 30 graus.
APP: Ok, mantenha proa 180.
F/O: 180.
Cap: Temos que nivelar. Volte, volte, volte.
APP: United, apenas para avisar, há uma autoestrada de quatro pistas nas proximidades, caso vocês precisem.
Cap-RDO: Ok, vamos ver o que acontece. Nós já abaixamos o trem, então precisaremos descer sobre algum tipo de pavimento sólido.
Cap-3: Droga, o melhor teria sido não abaixar o trem.
F/E: Agora já era.
Cap-3: Ah, não sei.
Cap: Mantenha a curva se puder.
Cap-3: Para onde?
Cap: Proa 180. Só dá para ir para a direita. Então é pra lá que temos que ir (risos).
APP: United 232, se conseguir manter essa altitude, curva a direita para proa 180 deixará vocês a 10 milhas da cabeceira.
Cap-RDO: É isso que estamos tentando.
F/O: Vamos ver se conseguimos descer devagar, Al?
Cap: Ok, é isso que vamos fazer. Atenção agora: puxe, puxe (a coluna de controle) com toda força!
Cap-3: Para onde vamos?
Cap: O mais próximo possível do aeroporto. Vamos para o aeroporto.
Cap-3: Ok.
Cap: E, paciência, se tivermos que pousar fora do aeroporto, pousaremos onde pudermos. Diga ao controle que temos mais uns 4 minutos até o pouso.
F/O-RDO: Ah, controle, temos mais uns três, quatro minutos até o pouso, ok?
Cap-PA: Atenção, comissários, Brace! Brace! Brace!
F/E-PA: Atenção, pousaremos em quatro minutos, quatro minutos.
APP: United 232, vocês vem para o aeroporto ou vão pousar numa estrada?
F/O-RDO: Ah, controle, estamos ainda tentando manter uma altitude. Estamos flutuando entre 1.500 e 2.000 pés, em ondas.
Cap-3: Tá lá o aeroporto!
Cap: Ainda não o vejo.
F/O: Está alí.
APP: United 232, o aeroporto está a 18 milhas agora, proa 220 da presente, você terá de rumar sul para evitar sobrevoar a cidade. Se conseguir manter por enquanto a proa 180.
F/O-RDO: Estamos tentando, estamos tentando.
Cap-3: Se mantermos 200 nós, acho que consigo algum controle.
APP: United 232, avise se vocês forem pousar numa estrada ou algo assim.
Cap-RDO: Estamos na proa 180. Qual a instrução agora?
APP: United 232, esta proa está boa por mais sete milhas.
Cap: Pra frente, pra frente, dá para virar à esquerda?
Cap-3: Não dá?
Cap: Nada?
Cap-3: Vou tentar um pouquinho.
Cap: Retarde, retarde, retarde. Avance, não, avance, avance. Ei, esse pouso vai ser divertido, não? (risos)
APP: United 232, você consegue manter essa proa?
Cap-RDO: Sim, estamos tentando manter.
APP: United 232, se conseguir manter, essa proa o colocará numa final de três milhas.
F/O-RDO: Ok, estamos brigando para manter essa proa.
Cap: Sabe, vou cancelar os brevês de todos vocês se conseguirmos nos livrar desta. Quando conseguirmos nos livrar desta. Segure, mantenha essa proa.
APP: United, o aeroporto está bem na sua proa, a 13 milhas.
F/O-RDO: Ok, estamos avistando.
Cap-RDO: Qual a elevação do campo?
APP: 1.100 pés, United.
Cap-RDO: Ok, obrigado.
Cap-3: Temos que começar a descer.
Cap-RDO: Estamos iniciando a descida agora, temos um pouco mais de controle de profundores.
APP: United 232, entendido. Aeroporto a 10 milhas agora.
Cap-3: Avistei, avistei.
Cap: Eu não. Mantenha o alinhamento.
Cap-3: Um pouco à direita, ali.
F/O: Bem ali. Vamos ver se conseguimos manter uma razão de 500 pés de descida.
APP: United, se não conseguir chegar ao aeroporto, há uma auto-estrada interestadual no alinhamento norte-sul, à leste do aeroporto. Ela tem quatro pistas.
Cap-3: Vê? Estou vendo a torre de controle, na posição uma hora.
Cap-RDO: Nós acabamos de ver a estrada e. Aeroporto avistado. Aeroporto avistado. Aeroporto avistado. Vamos tentar o aeroporto. Estaremos logo aí com vocês, e obrigado, muito obrigado por toda a cooperação de vocês.
APP: Ok.

O Dc-10 entra, finalmente, nos minutos finais de voo. A tripulação concentra-se em manter a aeronave estabilizada na aproximação. Mas essa é uma batalha duríssima. Haynes segura o manche. O primeiro oficial força a coluna de comando para a frente, tentando abaixar o nariz do jato. O cmte. Fitch cuida apenas de controlar os manetes de potência dos motores 1 e 3, tentando com isso fazer as curvas e subir ou descer um pouco as asas.

Cap-3: Abaixe o nariz, abaixe.
F/O: Oh, baby.
Cap-3: Abaixe.
Cap: Avise os passageiros que faltam dois minutos.
APP: United 232, vento 010 com onze nós. Vocês estão livres para pousar em qualquer pista.
Cap-RDO: (risos) Ok, entendido. Você pode ser mais específico em relação à uma pista para nosso pouso? (risos)
F/E-PA: Atenção, dois minutos para o pouso, dois minutos.

Na cabine de passageiros, as comissárias começam a gritar para que os ocupantes mantenham as cabeças baixas, crianças de colo no chão, que se preparem para o pouso. O voo 232 está chegando ao fim.

Cap-3: Qual o vento?
Cap-RDO: Por favor, o vento, mais uma vez?
APP: United 232, vento 010 com onze nós.
F/O: Sim, vamos pousar!
Cap-3: Avistada a pista, está difícil manter o controle!
F/O: Olha o alinhamento!
Cap: Uma curvinha a esquerda.
F/O: Um pouquinho à esquerda, Al.
Cap-RDO: Por favor, o vento, mais uma vez?
APP: United 232, vento 010 com onze nós, e há uma pista fechada, que está alinhada de nordeste para sudoeste.
Cap-RDO: É para essa que vamos.
APP: Então vamos remover os equipamentos de emergência dela.
Cap-RDO: Qual seu comprimento?
APP: 2.200 metros, estamos removendo os equipamentos dela.
Cap-3: Vou armar os spoilers ao tocarmos, ok?
Cap (ao primeiro-oficial): Pise com tudo nos freios junto comigo, ok?
Cap: Reduza potência. Reduza. Isso mesmo. Reduza o motor esquerdo.
F/O: Reduza o esquerdo.
APP: Ao final da pista há um descampado livre.

O grande jato cruza os limites do aeroporto e se aproxima mais rápido do que de costume. O DC-10 aproxima-se da cabeceira a mais de 220 nós, pois não podia contar com flaps, que aumentariam a sustentação e diminuiriam a velocidade de aproximação. Os três pilotos dão tudo de si, mas manter o enorme jato estabilizado é humanamente impossível nessas circunstâncias. O DC-10 cruza a cabeceira da pista, ligeiramente à esquerda do eixo da mesma.

Cap: Manete da esquerda, esquerda, esquerda, esquerda, esquerda.

Nesse instante, uma voz não identificada grita na cabine: "Deus!" É a ultima palavra proferida antes do som do primeiro impacto com o solo e do fim da gravação das caixas-pretas do DC-10.

A despeito de todos os esforços dos tripulantes, o DC-10 não fez um pouso, tecnicamente falando. Ele caiu sobre a pista 22. Bateu primeiro com a a ponta da asa direita. Em seguida, o trem de pouso principal direito bateu com tamanha força na pista que afundou-se no concreto, partindo-se imediatamente. Pelo ângulo do toque inicial e pela severidade do impacto, a aeronave desintegrou-se instantaneamente. Após o primeiro contato com o solo, a aeronave virou de dorso e bateu novamente contra a pista 22, com a fuselagem já fragmentada em grandes seções, separadas já da cauda e de quase toda a asa direita. Os destroços começaram a se dispersar pela pista e pelas cercanias. A parte principal da fuselagem, junto com a maior parte dos destroços somente pararia a mais de 1.200 metros além do ponto inicial de impacto. Boa parte dos destroços acabou indo parar mesmo fora da pista, onde um milharal serviu para reduzir a distância percorrida pelos destroços no solo.

Se o milharal funcionou como um amortecedor natural, em seguida a plantação, que estava alta, representou uma barreira natural que dificultou a saída dos sobreviventes dos destroços, que já ardiam em chamas. O combustível remanescente nos tanques pegou fogo imediatamente após o impacto inicial, e o fogo seria um dos principais causadores da morte de 111 dos 307 ocupantes do voo United 232.

Os relatos dos sobreviventes, sobretudo quanto aos segundos imediatamente após o primeiro impacto, são impressionantes. Uma comissária disse o seguinte:

"Todos os passageiros estavam na posição de impacto, cabeças abaixadas. A primeira pancada não foi tão forte, mas na segunda, achei que iria sair voando. Os bagageiros começaram a se abrir e então senti uma bola de fogo entrar na cabine. Ela entrou pelo lado esquerdo e percorreu uns três quartos da cabine. No segundo seguinte, houve outra pancada fortíssima e, quando dei por mim, estava amarrada ao meu assento, de ponta cabeça. Abri os olhos e nada ao meu redor parecia com uma cabine de um avião. Tudo estava destroçado, irreconhecível. Desafivelei meu cinto e caí sobre um monte de escombros. Consegui ficar de pé e notei que havia um rasgo, uma fresta por onde era possível sair. Foi bem a tempo: onde eu estava, rapidamente uma coluna de fumaça negra tomou conta de tudo. Vi um passageiro preso aos destroços pelas canelas. Com algum esforço, consegui liberá-lo e então saímos de lá e demos de cara com um milharal. Não dava para ver muito além, pois o milho estava alto. Era difícil caminhar e mais ainda, fugir correndo, pois tinha medo de uma explosão. Vi outro comissário e ele andava como um zumbi, mudo, o olhar perdido."

Uma passageira de 25 anos, conta como conseguiu escapar, salvando seu filho de apenas 23 meses:

"Deitei meu filho sobre um cobertor e o coloquei no chão, como havia sido instruída a fazer por uma comissária. Coloquei um travesseiro entre sua cabeça e a parede do avião e esperei, segurando suas pernas e mantendo seu peito firme contra o chão. A aeronave bateu no chão e então vi meu filho voar. Consegui agarrá-lo pela cintura. Ele bateu a cabeça várias vezes, enquanto eu lutava para trazê-lo junto ao meu peito. Quando o avião finalmente parou de rolar e capotar, estávamos de cabeça para baixo, presos ao assento pelo meu cinto de segurança. Quando soltei o cinto, caímos no teto do avião. Eu bati de ombro e meu filho, mais uma vez, bateu a cabeça. Um homem sentado ao meu lado me ajudou. Com meu filho nos braços, ele me empurrou para fora do avião. Saí por uma abertura e por ela vários outros passageiros que ainda conseguiam andar, saíram também.

O fato é que o comandante Alfred Haynes e seus colegas de cabine, todos sobreviventes do voo United 232, foram absolutamente brilhantes em sua luta para controlar o DC-10. Não fosse pelo talento e sangue frio dos pilotos do United 232, certamente não haveria sobreviventes nesta que poderia ter sido, potencialmente, a mais mortífera tragédia aérea da aviação civil norte-americana. Numa luta desigual, pode-se mesmo celebrar a vitória da vida sobre a morte, travada numa batalha heróica de Alfred Haynes e seus colegas pilotos.

Fotos e Vídeo do UAL 232


Acidente UA 232

Air Crash Flight 232 UA

Desastre Aéreo

Fonte: Este relato foi extraído do extinto site Jetsite, do grande Gianfranco "Panda" Beting, da seção Blackbox, com fins de não se deixar perder o conteúdo daquele fabuloso site, nossa principal fonte de referência no mundo da aviação nos anos 2000. O texto é do Panda, algumas fotos e vídeos colocamos a parte, para contribuir com mais dados e informações.

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