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AF 4590 - Pássaro Ferido (Acidente do Concorde)

Relato de Acidente da Air France com o Concorde

O dia 25 de julho de 2000 era típico dos quentes e gloriosos verões parisienses. Um céu azul e um sol intenso banhavam toda a região de Paris, de onde sairia um voo especial, o Air France AF 4590.



Naquela tarde, o Concorde matrícula F-BTSC, decolaria do aeroporto de Charles de Gaulle em Paris com destino a New York, aeroporto John F. Kennedy International, levando 100 turistas, a maioria alemães, que haviam fretado o supersônico para o início de doze dias de ferias, que continuariam num cruzeiro marítimo.

Além dos 100 turistas, estariam a bordo 2 comissários, quatro comissárias e os três tripulantes técnicos: Comandante Christian Marty, 54 anos, piloto de Concorde há três anos; Primeiro Oficial Jean Marcot, 50 anos, há 11 no Concorde; engenheiro de voo Gilles Jardinaud, 58 anos, com três anos de serviço no supersônico.

Marty não era um ser humano comum, e não apenas por figurar entre a verdadeira elite de sua profissão, como piloto comercial supersônico. Casado, pai de dois adolescentes, em 1982 ele havia superado um desafio notável: atravessou o Atlântico Norte numa prancha de windsurf. Por longos 37 dias, 16 horas e vinte e cinco minutos, ficou preso à sua prancha, dormindo amarrado à ela, de maneira a poder comprovar a façanha de atravessar o Oceano Atlântico numa prancha de surfe. Essa façanha deixa claro que o cmte. Marty possuía uma força de vontade excepcional. Marty também era muito respeitado por sua coragem e tranquilidade para lidar com situações extremas. Naquela tarde de julho de 2000, Marty levaria apenas três horas para fazer a mesma travessia, pilotando o Concorde.

Jean Marcot era apaixonado pelo Concorde. Tanto assim que se recusou a assumir o comando em outros tipos de aeronave, preferindo permanecer pelo resto de sua carreira como co-piloto no supersônico. Marcot dizia que preferia morrer a ter de pilotar outra aeronave que não o Concorde. "Acima de mim, apenas os astronautas" dizia sem disfarçar o orgulho que sentia em pilotar o supersônico.

Esses profissionais apresentaram-se pouco depois do meio dia no centro de despachos da Air France, próximo do aeroporto. Chegaram ao Concorde de matrícula F-BTSC por volta das 14h00 e iniciaram os longos procedimentos de verificações e checks que antecedem cada voo do complexo supersônico. Essa aeronave em particular já registrava 25 anos de uso. Construída em 1975, tinha 4.873 ciclos e 11.989 horas de voo.

Durante os preparativos para o voo, indicaram aos mecânicos da Air France a necessidade de duas ações não programadas: a troca do motor pneumático do reversor do motor número dois; a substituição de um sistema do trem de pouso esquerdo. Estes procedimentos provocaram um atraso na partida de mais de uma hora. Esse atraso teria conseqüências trágicas.

O Voo 4590 do Concorde

Finalmente, com os 109 ocupantes a bordo, o primeiro oficial Marcot solicitou autorização para iniciar a viagem. Pesando no momento da decolagem 186,9 toneladas, com 95 toneladas de combustível contabilizadas nesse total, o Concorde estava no seu peso máximo permitido.

As 16h37, entrou na pista 26R (4.217m) para iniciar o voo CO 55 com destino a Newark, o DC-10-30 de prefixo N13067, pertencente à Continental Airlines. A veterana aeronave, fabricada em 1973, já contabilizava 27 anos de serviço e começava a mostrar a idade com sinais nada agradáveis: durante sua corrida de decolagem, um pedaço de metal, usado na fixação de um dos motores, desprendeu-se e no meio da pista, como uma lâmina, pronta a cortar quem por sobre ela ousasse passar.

Steel iron piece air crash


Quis o destino que o pneu dianteiro direito do trem de pouso principal esquerdo do Concorde passasse justamente por cima da peça. A peça, feita de titânio rasgou um dos pneus do Concorde. Pedaços de metal e borracha foram arremessados contra a parte inferior da asa, rompendo a delgada pele metálica do intradorso e perfurando o tanque de combustível nº 5. Pressurizado, o tanque começou a jorrar o JP4 em ritmo acelerado para fora da asa. As chamas resultantes da pós-combustão dos quatro motores Olympus ou mesmo um eventual curto circuito próximo da baía do trem de pouso fez com que o combustível que escapava entrasse em ignição. Em segundos, a asa do Concorde ardia como uma tocha acesa.

Vamos agora acompanhar os últimos momentos do voo AF4590, com a reprodução dos diálogos gravados na caixa-preta do supersônico.

16h42:17.00 - Torre CDG: Air France quarenta e cinco noventa, autorizado livre decolagem, pista 26 direita, vento zero noventa, oito nós.
16h42:21.16 - Primeiro oficial: Quarenta e cinco noventa, autorizado livre decolagem, pista 26.
16h42:24.21 - Comandante: Todo mundo pronto?
16.42:25.19 - Primeiro oficial: Sim.
16.42:26.00 - Engenheiro: Sim.
16.42:26.15 - Comandante: Vamos para 100, V1 e 150.

Christian Marty acelera os quatro motores Olympus 593, abrindo o máximo de potência e ligando os sistemas de pós-combustão, que injetam combustível no bocal de saída de cada motor, aumentando a potência, o ruído, e principalmente, o consumo. Quando 100% da força é alcançada, o cmte. Marty indica o início da corrida de decolagem, com a curta palavra a seguir, ao mesmo tempo que solta os freios do Concorde:

16.42:31.00 - Comandante: Top.

16.42:31.07 Neste momento, os microfones de cabine registram a mudança no som na cabine. Com os freios soltos, os motores, acelerados ao máximo, começam a permitir a rápida aceleração na pista. Quatro segundos mais tarde, uma voz não identificada, externa ao Concorde, é ouvida na fonia, como que incentivando o comandante Christian Marty:

16.42:35.08 - Transmissão VHF: Vamos, Christian!

16h42:43.08 - Engenheiro: Temos os quatro afterburners.
16h42:54.16 - Primeiro oficial: Cem nós.
16h42:55.13 - Comandante: Confirmado.
16h42:57.00 - Engenheiro: Quatro (luzes) verdes. (os quatro motores a plena potência)
16h43:03.17 - Primeiro oficial: V-1.
16h43:07.00 - Começa neste instante um som de baixa freqüência.
16h43:11.22 - Comandante: (*) - ininteligível.
16h43:13.00 - Primeiro oficial: Atenção.

O diálogo anterior mostra que na cabine de comando, coisas começam a acontecer fora do previsto. No instante seguinte, a torre de controle de Charles de Gaulle alerta os tripulantes do AF4590 que a emergência que eles começam a enfrentar é mesmo séria.

16h43:13.09 - Torre CDG: Concorde quarenta e cinco noventa, você tem chamas, você tem chamas atrás de você.
16h43:16.03 - Transmissão VHF: Direita!
16h43:18.20 - Primeiro oficial: Roger.
16h43:20.11 - Engenheiro: Pane no motor número dois.

16h43:22.21 - Começa a soar o alarme de incêndio do motor. Uma voz não identificada entra na freqüência, e comenta:
Está queimando muito, hem?

16h43:24.20 - Engenheiro: Corte o motor número dois.
16h43:25.19 - Comandante: Procedimento de fogo no motor!

16h43:26.19 - Cessa o alarme de fogo.

16h43:27.04 - Primeiro oficial: Atenção! Olha a velocidade! Velocidade!

O Primeiro oficial refere-se certamente à brutal desaceleração que o Concorde começa a sofrer. Não apenas o motor dois havia sido cortado, como o motor número um começa também a falhar e não render toda a potência necessária para a decolagem. Alarmado, o Primeiro oficial alerta mais uma vez:

16h43:28.05 - Primeiro oficial: Velocidade!

O horrível espetáculo do pássaro branco em chamas mobiliza as atenções de todos no aeroporto. Outra voz entra na freqüência, como se o comentário pudesse alertar os tripulantes do AF 4590.

Flight 4590 Concorde


16h43:28.17 - Está queimando muito mesmo, mas não tenho certeza se o fogo está saindo do motor!

Dentro da cabine de comando do Concorde, não há tempo para o medo: os procedimentos de emergência tomam toda a atenção dos três tripulantes. Ouve-se claramente o botão e o sistema de extinção de fogo ser acionado.

16h43:30.00 - Comandante: Trem de pouso recolhendo.

16h43:31.15 - Torre CDG: Quarenta e cinco noventa, você tem chamas atrás de você.

16h43:34.17 - Primeiro oficial: Entendido.

Na barriga do pássaro, o estrago é grande. A porta do trem de pouso esquerdo, em conseqüência do fogo, não se abre, impedindo a retração completa das rodas, o que contribui para desestabilizar o supersônico e para aumentar o arrasto. O engenheiro de voo percebe a indicação.

16h43:35.13 - Engenheiro: O trem de pouso não...

16h43:37.08 - Torre CDG: Segundo sua conveniência, vocês tem prioridade para retornar.

16h43:37.18 - Engenheiro: O trem de pouso!
16h43:38.10 - Primeiro oficial: Não?
16h43:39.00 - Comandante: (trem de pouso) recolhendo.

16h43:42.07 - Volta a soar na cabine o alarme de fogo.

16h43:45.16 - Primeiro oficial: Estou tentando.
Engenheiro: Estou desligando!
16h43:46.08 - Comandante: Está desligando o motor dois?
16h43:48.04 - Engenheiro: Já cortei!

O Concorde, como um pássaro ferido mortalmente, luta para permanecer no ar. Com a perda brutal de potência, a velocidade está abaixo do normal e do que é necessário para a segurança do voo. O primeiro oficial alerta novamente.

Concord 4590 Air Crash


16h43:49.22 - Primeiro oficial: Velocidade!

Segundos preciosos são gastos pelo comandante Marty, que tenta estabilizar o aparelho. O motor número um também não rende a potência necessária, e o Concorde se mantêm no ar com esforço. Checando o painel à sua frente, o engenheiro de voo observa mais uma vez que as luzes de indicação de trem recolhido não se acendem.

16h43:56.17- Primeiro oficial: O trem de pouso não recolhe.

16h43:58.15 - Retorna o alarme de fogo. E menos de um segundo depois, o GPWS soa pela primeira vez, indicando que o Concorde voa baixo demais, próximo demais ao solo.

16h43:59.03 - (gravação do GPWS): Whoop whoop pull up! Whoop whoop pull up!

16h44:00.17 - Primeiro oficial: Velocidade!

16h44:02.00 - (gravação do GPWS): Whoop whoop pull up!

Para quem está no solo, a visão é horrível. Voando baixo e lento demais, o Concorde deixa um rastro de fogo e de fumaça negra. Nesse momento, o motor número um falha e entra em estol, deixando de produzir a potência fundamental para manter o jato no ar. O Concorde e seus 109 ocupantes estão condenados.

Air France Flight 4590 Concorde Air Disaster


No aeroporto Charles de Gaulle, os bombeiros chamam a torre de controle:

16h44:03.00 - Torre De Gaulle do serviço de bombeiros!

16h44:05.04 - Torre CDG: Serviço de bombeiros, uh, o Concorde não avisou suas intenções, tomem posição próximo das cabeceiras sul.

16h44:13.05- Torre De Gaulle do serviço de bombeiros, solicita ingresso para entrar na pista 26 direita.

Ouvindo o diálogo acima, o Primeiro oficial responde à torre e aos bombeiros, sem dar maiores detalhes, qual a intenção do comandante do AF4590:

16h44:14.15 - Primeiro oficial: Le Bourget, Le Bourget!

O primeiro oficial Marcot ainda acredita que o Concorde consiga chegar ao aeroporto de Le Bourget, situado a apenas alguns quilômetros de distância de Charles de Gaulle e, naquele momento, a meros 2 km da proa do supersônico. Mas o comandante Marty sabe que não conseguirá levar o Concorde até lá. Sua voz fica gravada, comentando num tom resignado:

16h44:16.12 - Comandante: Tarde demais.

A torre de controle dá outra instrução aos bombeiros.

16h44:18.02 - Torre CDG: Serviço de bombeiros, o Concorde vai retornar para a pista 09, na direção oposta!

O comandante Marty ouve o diálogo e comenta a informação.

16h44:19.19 - Comandante: Não dá tempo, não.

O primeiro oficial então comunica à torre de Charles de Gaulle:

16h44:22.19 - Primeiro oficial: Negativo, vamos a Le Bourget!

Bombeiros: - Torre De Gaulle do serviço de bombeiros, pode fornecer a situação do Concorde?

16.44:27.13 - Não houve tempo para responder sobre a situação do Concorde. Voando a apenas 200 nós, 100 nós a menos que o necessário para o peso que tinha naquele momento, o leme de direção perdeu sua autoridade. O Concorde não podia mais ser controlado. Sem velocidade para continuar voando, o jato estolou. O Concorde virou 180º sobre seu eixo e ficou de dorso, de costas para o solo, um pássaro abatido em pleno voo.

A bordo da cabine de comando, a voz esgarçada do comandante Marty foi gravada em três rápidos grunhidos, entre as 16h44:29.00 e 16h44:30.18, mostrando o enorme esforço físico que ele exercia para evitar a queda. Sua respiração ofegante e o som de objetos caindo e batendo dentro da cabine de comando, ficam gravadas como os últimos sons a bordo do F-BTSC.

Eram exatamente 16h44:31.16 quando se deu o fim da gravação. Exatamente dois minutos e nove centésimos de segundo após a liberação dos freios na pista do aeroporto Charles de Gaulle, o Concorde bateu contra um terreno descampado e atingiu também o Hotelíssimo, um pequeno hotel de três andares. Com o impacto, as 95 toneladas de combustível explodiram imediatamente, ceifando numa fração de segundo a vida dos 109 ocupantes do supersônico e de mais quatro funcionários do hotel.

Voando desde 1969, este foi o primeiro acidente fatal com o Concorde. As operações com o supersônico foram imediatamente suspensas pela Air France e, dois dias depois, pela British Airways. Esse seria ao começo do fim da carreira do Concorde, pois em 16 de agosto de 2000, o certificado de aeronavegabilidade do jato foi cassado. Um programa de modificações foi iniciado, o que permitiu a volta do jato aos serviços regulares apenas em 7 de novembro de 2001. Mas então o mundo já era outro, afetado pelos atentados de 11 de setembro de 2001. As operações regulares com o Concorde foram suspensas, definitivamente, em 24 de outubro de 2003.

Fotos e Vídeos do Acidente com o Concorde no Voo 4590





Queda avião Concorde


https://en.wikipedia.org/wiki/Air_France_Flight_4590

Fonte: Este relato foi extraído do extinto site Jetsite, do grande Gianfranco "Panda" Beting, da seção Blackbox, com fins de não se deixar perder o conteúdo daquele fabuloso site, nossa principal fonte de referência no mundo da aviação nos anos 2000. O texto é do Panda, algumas fotos e vídeos colocamos a parte, para contribuir com mais dados e informações.

United 232 - Batalha Heróica no Voo UAL 232 (Blackbox do Jetsite)

Relato de Acidente da seção Blackbox do Jetsite

No dia 19 de julho de 1989, o comandante Alfred Haynes, 58 anos, despertou para cumprir mais um dia de trabalho. Com 37.000 horas de voo, Haynes não sabia que, antes daquele dia acabar, ele entraria para a história da aviação comercial. Sua profissão era, e ainda é, uma das poucas que provocam admiração generalizada. Pilotos de aviões são apontados nas ruas, clubes e condomínios. Famílias falam com orgulho quando têm um parente, mesmo distante, que seja "piloto de avião".



A admiração deve-se, sobretudo, a um fato que embora passe longe da verdade, provoca respeito em todo mundo: a ideia de que pilotos de aviação comercial arriscam a própria vida no cumprimento da função. A verdade é que pilotar um grande jato comercial hoje em dia é infinitamente mais seguro, por exemplo, do que conduzir ônibus, táxis ou até mesmo trens de metrô. Mas se a aviação conquistou esse invejável nível de segurança, o fez, em grande parte pela perícia e bravura de pilotos como Haynes. É o que você vai ver agora neste Blackbox, que mostra a impressionante façanha de Haynes e seus colegas de cabine no voo United 232.

Acidente com o United 232

Naquele dia, o voo UAL 232 partiu de Denver, então um dos mais importantes hubs da United, com destino à sede da empresa e sua base operacional mais relevante, Chicago. A bordo do DC-10-10 de prefixo N1819U, iam 296 passageiros, 8 comissários (as) e três tripulantes técnicos. O voo havia partido do Colorado sem qualquer anormalidade e prosseguiu assim até exatamente 15h16, quando, sem qualquer indicação prévia, o DC-10 experimentou uma tremenda explosão. O motor número dois, posicionado na cauda da aeronave, simplesmente desintegrou-se. Partes do motor ainda girando saíram em todas as direções, danificando a cauda do aparelho, cortando sua fuselagem, e pior, rompendo dutos dos três sistemas hidráulicos independentes e redundantes, responsáveis pela operação dos sistemas de controle do jato.

Numa fração de segundos, o DC-10 tornou-se praticamente incontrolável: não possuía mais leme, profundores, flaps ou slats que pudessem controlar seu vôo. Donde, a tripulação liderada por Haynes não podia fazer curvas, subir ou descer o nariz, uma asa, ou praticamente nenhum controle de forma confiável. A única condição para obter um nível limitadíssimo de controle era o de alternar a potência dos dois motores restantes, um em cada asa, de forma a girar o nariz para um lado ou para outro, e desta forma, tentar fazer curvas desajeitadas no ar. A redução da potências dos dois motores restantes também faria com que o DC-10 reduzisse sua altura, também de forma bastante elementar. Mal comparando, se antes Haynes pilotava um Cadillac, agora tinha nas mãos um carro de rolimã.

Do momento da explosão até o final do voo 232, passaram-se 41 minutos de terror para os passageiros e de muito trabalho e coragem para os tripulantes. O mais notável é que Haynes e seus colegas, em face do que os aguardava, mantiveram tranquilidade e até mesmo bom humor. Agora você vai entrar na cabine do United 232 e comprovar que a diferença entre a vida e a morte pode estar mesmo nas mãos de um time de bons profissionais.

Cap: Comandante Al Haynes
Cap-RDO: transmissão de rádio do comandante ao solo
F/O: primeiro-oficial
F/O-RDO: transmissão de rádio do primeiro-oficial
F/E: engenheiro de vôo
F/E-RDO: transmissão de rádio do engenheiro de vôo
Cap-2: Comandante extra (sentado no jump-seat)
Cap-3: Denny Fitch, comandante viajando como passageiro
SAM: System Aircraft Maintenance (freqüência de manutenção da United)
UAL: Despacho operacional da United em Chicago

Cap-RDO: Sioux City, estamos controlando a aeronave usando apenas os motores. Acho que não conseguimos fazer curvas para a esquerda. Parece que só conseguimos curvar à direita. Estamos iniciando uma curva leve à direita agora.
APP: Ah, United 232 Heavy, Sioux City, entendido não consegue fazer curvas para a esquerda. Parece que só consegue curvar à direita, entendido.
Cap-RDO: Afirmativo.
APP: Entendido, sua proa atual o coloca a oito milhas ao norte do aeroporto, senhor. E, ah, talvez consiga alinhar com a pista 31 se fizer uma leve curva à esquerda ou tentar aproximar-se com uma longa curva pela direita.
Cap-RDO: Ok. Girando à direita agora. Talvez consigamos pequenas curvas na reta final, mas por enquanto... Faremos curvas à direita para a proa que vocês determinarem.
APP: Ok, United 23 heavy, curva à direita, proa 255.
Cap-RDO: Dois cinco.
Cap: E agora o maldito profundor também não quer trabalhar. Rolando à direita.
F/E-RDO: SAM, aqui é o United 232. Nosso motor número dois explodiu e perdemos os sistemas hidráulicos. Só controlamos com assimetria de potência, ah, mantendo vôo nivelado. Nós perdemos o controle do leme e profundores.
F/O: Muito pouco controle de profundores. Estão muito duros ou travados ou sem autoridade alguma.
SAM: United 232, entendemos que vocês perderam o motor nº2 totalmente?
F/E-RDO: Afirmativo.
SAM: United 232, vocês ainda têm os sistemas hidráulicos 1 e 3 operando normalmente?
F/E-RDO: Negativo. Todos os três sistemas hidráulicos inoperantes. Os únicos itens que nos restam são... (O engenheiro elenca uma lista de sistemas e instrumentos que ainda estão em operação normal).
SAM: United 232, entendemos que vocês têm força normal nos motores nº1 e 3?
F/E-RDO: Afirmativo.
SAM: United 232, Toda a quantidade de fluido hidráulico perdida?
F/E-RDO: Sim, toda a pressão foi perdida. Olha, nós precisamos de assistência de vocês. Estamos tendo muita dificuldade em controlar o avião!
SAM: Ok, United 232. Ok, vamos tentar ajudá-los. Vamos revirar o manual do DC-10 e ver se ajudamos, ok?

Nesse instante, o comandante Haynes está concentrado em tentar obedecer as instruções de navegação informadas pelo centro de aproximação de Sioux City.
APP: United 232, consegue girar para a proa 240?
F/O-RDO: Vamos tentar, controle.
F/E: Deus, eu odiaria ter que mexer em alguma coisa por aqui.
Cap: É mas, não dá para ficar parado.
APP: United 232, informe POB (pessoas a bordo) e quantidade de combustível remanescente.
F/E-RDO: Temos 37.6 toneladas de combustível.
APP: Ok, entendido.
Cap: (dirigindo-se ao comandante extra) - Vá lá pra trás e veja como estamos. Dê uma olhada nas asas e veja como estamos.
Cap-2: Ok, vou lá ver como estamos.
Cap: Falou com o SAM (manutenção da United)?
F/E: Sim, falei.
Cap: O que eles estão dizendo?
F/E: Eles não disseram nada, não ajudaram nada.
Cap: Bom, amigos, não vamos conseguir chegar a pista nenhuma. Vamos ter que botar este avião no solo em algum lugar e esperar pelo melhor.

O comandante extra retorna a cabine e conta o que viu:

Cap-2: Nós estamos com os ailerons internos levantados. Só deu para ver isso.
Cap: Isso é porque estamos tentando ao máximo curvar agora. É por isso.
Cap-2: Me diga como posso ajudá-lo.
Cap: Perdemos o piloto-automático. Veja se você ajuda a ligá-lo.
Cap-2: Ok, vou tentar.
Cap: Manete da direita. Vamos manter o motor dois acelerado e reduzir o motor nº 1. Nós precisamos de controle nos profundores e não temos. E não sei como conseguir isso.
UAL: United 232, vocês querem pousar agora ou prosseguir para Chicago?
F/E-RDO: Olha, nós precisamos de todo apoio que vocês puderem dar. Falamos com o SAM e não obtivemos retorno. Nós perdemos tudo aqui. Não está fácil controlar e não sabemos mais o que fazer. Estamos a 17.000 pés e descendo. Nós, ah. Nós não temos praticamente mais nenhuma maneira de controlar o avião.
UAL: Ok, entendido, nós estamos contatando a base São Francisco para ver se eles ajudam. Para dar o máximo de ajuda a vocês agora mesmo.
F/E-RDO: Olha, não dá para chegar em Chicago. Nós vamos ter de pousar em algum descampado por aqui mesmo.
UAL: Ok, entendido.
Cap: Como estão preparativos lá atrás para um pouso forçado?
Cap-2: Estão cuidando disso, mas sem muita pressa.
Cap: É bom avisá-los para se apressar então. Não temos muito mais o que fazer aqui. Vamos ter de fazer um pouso forçado em algum lugar, muito em breve.
Cap-2: Tá bem, então.
Cap: É, não tem outro jeito. Não acho que consigamos chegar a algum aeroporto.
F/O: É, estamos com pressão hidráulica zero.

Neste momento, soa o alarme de trem de pouso não abaixado.

Cap: Vamos ter de descer isso (trem de pouso) de qualquer jeito.
F/O: Quer dar flaps agora?
Cap: Sim, pode dar flaps. Temos os slats?
Cap-2: Não.
Cap: Bom, que adianta? Não dá mais para piorar além disso. Comande os flaps. Bom, sem hidráulicos não vamos ter os flaps.
APP: United 232, consegue manter a presente proa?
Cap-RDO: Onde estamos em relação ao aeroporto, controle? Estamos voando em curvas.
APP: Bem na sua proa, a 36 milhas de distância.
Cap-RDO: ok, tentaremos ir numa linha reta, direto.
Cap: Assim que o nariz começar a subir, vamos ter de empurrar essas colunas de controle para a frente.
Cap-2: Não temos potência alguma no motor nº2?
Cap: Não, está desligado.
Cap: Precisamos manter uma proa de 300 agora. Nós agora só estamos conseguindo, mais ou menos, manter voo nivelado.
Cap-2: Com a ar mais denso, melhora a sustentação. O que temos é o que temos.
Cap: Está um pouco melhor. Não passei por nada parecido na minha última sessão de simulador (treinamento regular).

A tensão é quebrada. Todos riem dentro da cabine, apesar do fato aparente de que a aeronave, na melhor das hipóteses, enfrentará um pouso forçado.

Cap: Não, vamos lá. Vamos por este troço no chão. Não se preocupem.
F/O: Parece mais controlável agora, não, Al?
Cap-2: Sim, com o ar mais denso ele fica mais controlável. Nossas chances melhoram, não é?
Cap: Eu sei o que vou fazer. Vamos pousar em Sioux City. Vamos lá.
Cap-RDO: Sioux City, United 232. Você pode nos fornecer sua freqüência de ILS, rumo da pista e seu comprimento?
APP: United 232, afirmativo. Freqüência do localizador é 109.3 e vocês estão na presente a 35 milhas a noroeste do aeroporto. Proa para interceptar é. 240 para o localizador.
Cap-RDO: Ok, conseguimos algum controle agora. Qual o comprimento da pista?
APP: United 232, a pista tem 3.300 metros.
Cap-RDO: Ok, obrigado.

Nesse momento, o primeiro-oficial extra está controlando manualmente os dois manetes, sentado no jumpseat imediatamente atrás dos dois pilotos. A manutenção da United (SAM) ainda não é capaz de acreditar na perda quase total de controle, conseqüência direta da perda de todo fluido hidráulico, e ainda não deu ao voo 232 uma ajuda definitiva.

Cap: Vamos alijar combustível imediatamente. Temos que deixar o avião o mais leve possível. Acione o comando de alijamento acelerado.
F/E: Ah, certo, nem tive tempo de pensar em alijar combustível.
Cap: Tente não perder mais altitude, hem?
F/O: O que? Altitude?
Cap: É.
F/O: Ok, pode alijar o combustível.

Alguns instantes se passam enquanto o combustível é descartado por dois pontos especialmente dedicados a isso, no bordo de fuga das asas.

Cap-2: Ok, atingiu o peso, atingiu o peso, atingiu o peso. Faltam apenas uns mil quilos pra perder.
F/O: Ok.
Cap-2: Este desgraçado parece estar puxando mais para a direita, não?
APP: United 232, vocês informaram o número de ocupantes a bordo?
Cap-RDO: Olha, não tivemos tempo de checar isso, controle, não tivemos tempo de falar com as meninas lá atrás.
APP: Ok, entendido.
Cap: Retarde os manetes. Retarde. Está subindo.
Cap-2: Ok, retardando.
F/O: É, estamos subindo.
Cap: É, estou empurrando (a coluna de comando) com força total aqui.
Cap-2: Vou tentar colocar 90% de potência aqui, pra ver se vocês não precisam lutar contra esse pitch (ângulo do nariz da aeronave em relação ao horizonte).
F/O-RDO: Sioux City, United 232. Qual a nossa posição em relação ao aeroporto agora?
APP: United, vocês estão a 37 milhas, proa vinte graus.
Cap: Se você conseguir manter com os manetes uma curva de 10 a 15 graus.
Cap-2: OK, Vou ficar no controle, vou controlar, vou cuidar disso.
Cap: Você tinha conseguido nivelar as asas por um minuto.

Nesse instante, Denny Fitch, outro piloto da United que viajava no voo 232 como passageiro, entra na cabine de comando para oferecer ajuda. O comandante que até então ocupava a poltrona do jumpseat resolve então ceder seu lugar à Fitch.

Cap: Olá, meu nome é Al Haynes.
Cap-3: Oi, Al. Denny Fitch.
Cap: Como vai, Denny?
Cap-3: Eu te digo uma coisa: Vamos tomar uma cerveja juntos quando tudo isso terminar, ok?
Cap: Olha, eu não bebo, mas fica combinado. Depois dessa, vai valer a pena mesmo tomar uma.
Cap-3: Ok. Você perdeu um motor, não é?
Cap: Ele simplesmente explodiu, sem aviso. Não deu para fazer nada, a não ser desligá-lo.
Cap-3: Certo.
Cap: Olha, já pensamos em tudo aqui e não nos ocorreu nada que não tenhamos tentado. Não há, na verdade, nenhum procedimento para uma emergência como esta.
Cap-3: Olha, o que em algum momento terá de ser feito é abaixar os trens de pouso. Acho que isso vai servir também para abaixar o nariz.
APP: United, quando vocês conseguirem estabilizar na proa 240, o aeroporto estará alinhado com vocês a 38 milhas de distância.
F/O-RDO: Ok, estamos tentando controlar, mas não temos mais o sistema hidráulico e estamos fazendo curvas somente com a assimetria de potência. Estamos tentando fazer o melhor, mas não está fácil.
APP: Ok, já notificamos os equipamentos de emergência na área e estão todos esperando por vocês.

O comandante Haynes discute alguns detalhes como frequências e proas e chega à conclusão que é hora de iniciar a aproximação final. Uma comissária é chamada à cabine para receber também algumas instruções adicionais.

Cap: Ok, todos prontos?
Cap-3: Olha, qualquer velocidade acima de 210 vai resultar numa atitude de nariz para cima.
Cap: Olha, querida, vai ser duro, vai ser uma aterrissagem feia, difícil.
F/A: Ok, entendi. Nós vamos ter que evacuar a aeronave?
Cap: Sim. Vamos abaixar o trem.
F/A: Certo, entendi.
Cap: E se eu conseguir parar o avião com tudo em cima, nos dê uns dois segundos antes de iniciar a evacuação.
F/A: Entendido.
Cap: Quando chegar a hora, eu direi "segurem-se!" (em inglês, Brace) Esse será meu aviso de que chegou a hora. Vou falar pelo sistema de PA: Brace! Brace! Brace!
F/A: Vai ser essa a instrução para evacuar?
Cap: Não, essa vai ser a instrução para o pouso.
F/A: Ahã.
Cap: E então se você receber o sinal para evacuar você vai perceber, mas realmente duvido que a gente termine isso com as rodas todas no chão. Boa sorte, querida.
F/A: O... O... Obrigado, pra vocês também.

Trêmula, a comissária sai da cabine de comando e volta para instruir suas colegas do que deverá ser feito após o pouso.

F/E: A comissária me disse que parece haver algum tipo de estrago na asa, ela me disse. Não é melhor verificar isso?
Cap-3: Não dá mais tempo.
Cap: Ok, vá lá dar uma olhada, rápido.
Cap: Denny, não temos quase nenhum controle de profundores. Se ao menos tivéssemos um pouco, depois poderíamos nos preocupar em acertar a proa.

Todos riem na cabine, apesar da situação.

Cap: Vamos lá, vire um pouco, Denny.
Cap-3: Pra que lado?
Cap: Esquerda.
Cap-3: Esquerda.
Cap: Volte. Volte. Volte. Volte. Volte. Ahh, vamos ter que fazer mais uma curva então.
Cap-RDO: Ok, controle, vamos ter que fazer mais uma curva aqui. Nós temos um pouco mais de controle dos profundores, mas não conseguimos controlar as proas direito.
APP: United, os profundores estão funcionando o suficiente para garantir controle de altitude?
F/O: Muito pouco.
Cap-RDO: Negativo. Mas estamos um pouco melhor.
APP: Entendido.

O engenheiro retorna à cabine de comando e reporta o que viu:

F/E: Olha, dei uma olhada pelas janelas, os estabilizadores horizontais estão bastante avariados, isso deu para ver.
Cap: Bom, vamos descer mais um pouco agora, pessoal.
Cap-3: Ok, vou reduzir um pouco a potência.
Cap: Alguém têm alguma ideia de como abaixar o trem de pouso?
Cap-3: Por gravidade. Desde que as portas dos trens estejam abertas. Elas estão?
Cap: Estão.
F/O: E nós vamos ter problemas para frear também.
Cap: Ah, sim, não temos mais freios.
F/O: Nada de freios?
Cap: Alguma coisa, mas não muito.
Cap-3: Você só vai ter uma chance. Na hora de pisar nos pedais, pé. Esmague com tudo. Use toda a força. Você só vai ter essa chance. Bom, agora vamos virar e seguir para o aeroporto, ok?
Cap-RDO: Controle, vamos reiniciar uma curva de aproximação. Como não temos mais freios, sugiro que os equipamentos de emergência fiquem concentrados mais para o final da pista, ok? E independentemente do resultado do pouso, pelas condições da aeronave, nós vamos evacuá-la assim que pararmos. É melhor vocês avisarem as equipes de emergência disto, por favor.
APP: Ok, United 232. Se da presente vocês continuarem na proa 220, ela os levará direto para a cabeceira.
F/O-RDO: 220, entendido.
Cap-RDO: Qual o teto agora?
APP: Ah, teto é 4 mil pés, nuvens esparsas, visibilidade 15 milhas abaixo do teto.
Cap-RDO: Qual a elevação do aeroporto?
APP: 1098 pés (AGL).
F/O: Bom, a aproximadamente 5.000 pés deveremos estar visual. E, Al, se tivermos que usar os spoilers, também não teremos como, certo?
Cap: Acho que não. (dirigindo-se ao engenheiro de voo) E o que disse o SAM?
F/E: Nada, nada que pudesse nos ajudar.
Cap: Ok, esqueça eles. Diga a eles que vamos colocar esse avião no chão e saia da freqüência. Diga que você vai estar ocupado, deixe eles de lado, eles que se danem.
Cap-3: Qual a distância para o aeroporto?
Cap-RDO: Controle, qual a distância para o aeroporto?
APP: 35 milhas, se vocês continuarem essa curva para a esquerda, com mais quinze ou vinte graus, vocês estarão direto na proa do aeroporto.

Pelos minutos seguintes, os profissionais discutem a melhor maneira de abaixar o trem. Optam por liberar as travas e deixá-lo cair por gravidade. Depois de muitas discussões, usam este método, com sucesso.

Cap: Vamos lá.
F/E: Ok. ok. Temos três verdes! Trens baixados!
Cap: Ok, trave tudo o que puder, trave isso.
Cap-3: Ai, olha só, os slats estenderam.
Cap: Uma curvinha de nada para a direita. Não há muito o que fazer. Amarrem-se todos, vamos nós agora. (O cmte. Haynes solta um longo suspiro)
APP: United 232, você consegue fazer curvas à direita?
Cap-RDO: Sim, à direita sem problemas, à esquerda é que não dá.
APP: Entendido.
Cap: Bom, mamãezinha, agora vamos ver, agora vamos ver. Nós vamos logo saber se voltaremos a ver jogos de beisebol ou não.
F/O-RDO: por favor, onde está o aeroporto?
APP: 21 milhas, na sua proa.
Cap: 21 e mil pés, temos que nivelar agora.
APP: United 232, você terá de abrir a curva um pouco à esquerda, e ah, isso também irá evitar que vocês sobrevoem a cidade.
Cap-RDO: Seja o que for, nos mantenha longe da cidade.
Cap-3: Mantenha esse troço nivelado se você conseguir.
Cap: Nivelado, baby, nivelado, nivelado.
Cap-3: Mais, mais potência, mais, mais, mais.
F/O: Potência máxima!
Cap-3: Potência máxima!
APP: United 232 heavy, voe na proa 180, proa 180, proa uno-oito-zero.
Cap-RDO: Acho que não dá, mas vamos tentar.
APP: United 232, você está a 17 milhas a nordeste do aeroporto, vocês estão indo bem.
Cap-RDO: Vamos ter que curvar à direita para a proa 180.
Cap-3: Mantenha curva a direita, Al, mantenha curva a direita.
Cap: Temos que manter este desgraçado nivelado. Eu estava com medo de baixar os trens caso nós precisássemos fazer um pouso forçado.
APP: United 232, quão fechadas podem ser suas curvas?
Cap-RDO: Aproximadamente 30 graus.
APP: Ok, mantenha proa 180.
F/O: 180.
Cap: Temos que nivelar. Volte, volte, volte.
APP: United, apenas para avisar, há uma autoestrada de quatro pistas nas proximidades, caso vocês precisem.
Cap-RDO: Ok, vamos ver o que acontece. Nós já abaixamos o trem, então precisaremos descer sobre algum tipo de pavimento sólido.
Cap-3: Droga, o melhor teria sido não abaixar o trem.
F/E: Agora já era.
Cap-3: Ah, não sei.
Cap: Mantenha a curva se puder.
Cap-3: Para onde?
Cap: Proa 180. Só dá para ir para a direita. Então é pra lá que temos que ir (risos).
APP: United 232, se conseguir manter essa altitude, curva a direita para proa 180 deixará vocês a 10 milhas da cabeceira.
Cap-RDO: É isso que estamos tentando.
F/O: Vamos ver se conseguimos descer devagar, Al?
Cap: Ok, é isso que vamos fazer. Atenção agora: puxe, puxe (a coluna de controle) com toda força!
Cap-3: Para onde vamos?
Cap: O mais próximo possível do aeroporto. Vamos para o aeroporto.
Cap-3: Ok.
Cap: E, paciência, se tivermos que pousar fora do aeroporto, pousaremos onde pudermos. Diga ao controle que temos mais uns 4 minutos até o pouso.
F/O-RDO: Ah, controle, temos mais uns três, quatro minutos até o pouso, ok?
Cap-PA: Atenção, comissários, Brace! Brace! Brace!
F/E-PA: Atenção, pousaremos em quatro minutos, quatro minutos.
APP: United 232, vocês vem para o aeroporto ou vão pousar numa estrada?
F/O-RDO: Ah, controle, estamos ainda tentando manter uma altitude. Estamos flutuando entre 1.500 e 2.000 pés, em ondas.
Cap-3: Tá lá o aeroporto!
Cap: Ainda não o vejo.
F/O: Está alí.
APP: United 232, o aeroporto está a 18 milhas agora, proa 220 da presente, você terá de rumar sul para evitar sobrevoar a cidade. Se conseguir manter por enquanto a proa 180.
F/O-RDO: Estamos tentando, estamos tentando.
Cap-3: Se mantermos 200 nós, acho que consigo algum controle.
APP: United 232, avise se vocês forem pousar numa estrada ou algo assim.
Cap-RDO: Estamos na proa 180. Qual a instrução agora?
APP: United 232, esta proa está boa por mais sete milhas.
Cap: Pra frente, pra frente, dá para virar à esquerda?
Cap-3: Não dá?
Cap: Nada?
Cap-3: Vou tentar um pouquinho.
Cap: Retarde, retarde, retarde. Avance, não, avance, avance. Ei, esse pouso vai ser divertido, não? (risos)
APP: United 232, você consegue manter essa proa?
Cap-RDO: Sim, estamos tentando manter.
APP: United 232, se conseguir manter, essa proa o colocará numa final de três milhas.
F/O-RDO: Ok, estamos brigando para manter essa proa.
Cap: Sabe, vou cancelar os brevês de todos vocês se conseguirmos nos livrar desta. Quando conseguirmos nos livrar desta. Segure, mantenha essa proa.
APP: United, o aeroporto está bem na sua proa, a 13 milhas.
F/O-RDO: Ok, estamos avistando.
Cap-RDO: Qual a elevação do campo?
APP: 1.100 pés, United.
Cap-RDO: Ok, obrigado.
Cap-3: Temos que começar a descer.
Cap-RDO: Estamos iniciando a descida agora, temos um pouco mais de controle de profundores.
APP: United 232, entendido. Aeroporto a 10 milhas agora.
Cap-3: Avistei, avistei.
Cap: Eu não. Mantenha o alinhamento.
Cap-3: Um pouco à direita, ali.
F/O: Bem ali. Vamos ver se conseguimos manter uma razão de 500 pés de descida.
APP: United, se não conseguir chegar ao aeroporto, há uma auto-estrada interestadual no alinhamento norte-sul, à leste do aeroporto. Ela tem quatro pistas.
Cap-3: Vê? Estou vendo a torre de controle, na posição uma hora.
Cap-RDO: Nós acabamos de ver a estrada e. Aeroporto avistado. Aeroporto avistado. Aeroporto avistado. Vamos tentar o aeroporto. Estaremos logo aí com vocês, e obrigado, muito obrigado por toda a cooperação de vocês.
APP: Ok.

O Dc-10 entra, finalmente, nos minutos finais de voo. A tripulação concentra-se em manter a aeronave estabilizada na aproximação. Mas essa é uma batalha duríssima. Haynes segura o manche. O primeiro oficial força a coluna de comando para a frente, tentando abaixar o nariz do jato. O cmte. Fitch cuida apenas de controlar os manetes de potência dos motores 1 e 3, tentando com isso fazer as curvas e subir ou descer um pouco as asas.

Cap-3: Abaixe o nariz, abaixe.
F/O: Oh, baby.
Cap-3: Abaixe.
Cap: Avise os passageiros que faltam dois minutos.
APP: United 232, vento 010 com onze nós. Vocês estão livres para pousar em qualquer pista.
Cap-RDO: (risos) Ok, entendido. Você pode ser mais específico em relação à uma pista para nosso pouso? (risos)
F/E-PA: Atenção, dois minutos para o pouso, dois minutos.

Na cabine de passageiros, as comissárias começam a gritar para que os ocupantes mantenham as cabeças baixas, crianças de colo no chão, que se preparem para o pouso. O voo 232 está chegando ao fim.

Cap-3: Qual o vento?
Cap-RDO: Por favor, o vento, mais uma vez?
APP: United 232, vento 010 com onze nós.
F/O: Sim, vamos pousar!
Cap-3: Avistada a pista, está difícil manter o controle!
F/O: Olha o alinhamento!
Cap: Uma curvinha a esquerda.
F/O: Um pouquinho à esquerda, Al.
Cap-RDO: Por favor, o vento, mais uma vez?
APP: United 232, vento 010 com onze nós, e há uma pista fechada, que está alinhada de nordeste para sudoeste.
Cap-RDO: É para essa que vamos.
APP: Então vamos remover os equipamentos de emergência dela.
Cap-RDO: Qual seu comprimento?
APP: 2.200 metros, estamos removendo os equipamentos dela.
Cap-3: Vou armar os spoilers ao tocarmos, ok?
Cap (ao primeiro-oficial): Pise com tudo nos freios junto comigo, ok?
Cap: Reduza potência. Reduza. Isso mesmo. Reduza o motor esquerdo.
F/O: Reduza o esquerdo.
APP: Ao final da pista há um descampado livre.

O grande jato cruza os limites do aeroporto e se aproxima mais rápido do que de costume. O DC-10 aproxima-se da cabeceira a mais de 220 nós, pois não podia contar com flaps, que aumentariam a sustentação e diminuiriam a velocidade de aproximação. Os três pilotos dão tudo de si, mas manter o enorme jato estabilizado é humanamente impossível nessas circunstâncias. O DC-10 cruza a cabeceira da pista, ligeiramente à esquerda do eixo da mesma.

Cap: Manete da esquerda, esquerda, esquerda, esquerda, esquerda.

Nesse instante, uma voz não identificada grita na cabine: "Deus!" É a ultima palavra proferida antes do som do primeiro impacto com o solo e do fim da gravação das caixas-pretas do DC-10.

A despeito de todos os esforços dos tripulantes, o DC-10 não fez um pouso, tecnicamente falando. Ele caiu sobre a pista 22. Bateu primeiro com a a ponta da asa direita. Em seguida, o trem de pouso principal direito bateu com tamanha força na pista que afundou-se no concreto, partindo-se imediatamente. Pelo ângulo do toque inicial e pela severidade do impacto, a aeronave desintegrou-se instantaneamente. Após o primeiro contato com o solo, a aeronave virou de dorso e bateu novamente contra a pista 22, com a fuselagem já fragmentada em grandes seções, separadas já da cauda e de quase toda a asa direita. Os destroços começaram a se dispersar pela pista e pelas cercanias. A parte principal da fuselagem, junto com a maior parte dos destroços somente pararia a mais de 1.200 metros além do ponto inicial de impacto. Boa parte dos destroços acabou indo parar mesmo fora da pista, onde um milharal serviu para reduzir a distância percorrida pelos destroços no solo.

Se o milharal funcionou como um amortecedor natural, em seguida a plantação, que estava alta, representou uma barreira natural que dificultou a saída dos sobreviventes dos destroços, que já ardiam em chamas. O combustível remanescente nos tanques pegou fogo imediatamente após o impacto inicial, e o fogo seria um dos principais causadores da morte de 111 dos 307 ocupantes do voo United 232.

Os relatos dos sobreviventes, sobretudo quanto aos segundos imediatamente após o primeiro impacto, são impressionantes. Uma comissária disse o seguinte:

"Todos os passageiros estavam na posição de impacto, cabeças abaixadas. A primeira pancada não foi tão forte, mas na segunda, achei que iria sair voando. Os bagageiros começaram a se abrir e então senti uma bola de fogo entrar na cabine. Ela entrou pelo lado esquerdo e percorreu uns três quartos da cabine. No segundo seguinte, houve outra pancada fortíssima e, quando dei por mim, estava amarrada ao meu assento, de ponta cabeça. Abri os olhos e nada ao meu redor parecia com uma cabine de um avião. Tudo estava destroçado, irreconhecível. Desafivelei meu cinto e caí sobre um monte de escombros. Consegui ficar de pé e notei que havia um rasgo, uma fresta por onde era possível sair. Foi bem a tempo: onde eu estava, rapidamente uma coluna de fumaça negra tomou conta de tudo. Vi um passageiro preso aos destroços pelas canelas. Com algum esforço, consegui liberá-lo e então saímos de lá e demos de cara com um milharal. Não dava para ver muito além, pois o milho estava alto. Era difícil caminhar e mais ainda, fugir correndo, pois tinha medo de uma explosão. Vi outro comissário e ele andava como um zumbi, mudo, o olhar perdido."

Uma passageira de 25 anos, conta como conseguiu escapar, salvando seu filho de apenas 23 meses:

"Deitei meu filho sobre um cobertor e o coloquei no chão, como havia sido instruída a fazer por uma comissária. Coloquei um travesseiro entre sua cabeça e a parede do avião e esperei, segurando suas pernas e mantendo seu peito firme contra o chão. A aeronave bateu no chão e então vi meu filho voar. Consegui agarrá-lo pela cintura. Ele bateu a cabeça várias vezes, enquanto eu lutava para trazê-lo junto ao meu peito. Quando o avião finalmente parou de rolar e capotar, estávamos de cabeça para baixo, presos ao assento pelo meu cinto de segurança. Quando soltei o cinto, caímos no teto do avião. Eu bati de ombro e meu filho, mais uma vez, bateu a cabeça. Um homem sentado ao meu lado me ajudou. Com meu filho nos braços, ele me empurrou para fora do avião. Saí por uma abertura e por ela vários outros passageiros que ainda conseguiam andar, saíram também.

O fato é que o comandante Alfred Haynes e seus colegas de cabine, todos sobreviventes do voo United 232, foram absolutamente brilhantes em sua luta para controlar o DC-10. Não fosse pelo talento e sangue frio dos pilotos do United 232, certamente não haveria sobreviventes nesta que poderia ter sido, potencialmente, a mais mortífera tragédia aérea da aviação civil norte-americana. Numa luta desigual, pode-se mesmo celebrar a vitória da vida sobre a morte, travada numa batalha heróica de Alfred Haynes e seus colegas pilotos.

Fotos e Vídeo do UAL 232


Acidente UA 232

Air Crash Flight 232 UA

Desastre Aéreo

Fonte: Este relato foi extraído do extinto site Jetsite, do grande Gianfranco "Panda" Beting, da seção Blackbox, com fins de não se deixar perder o conteúdo daquele fabuloso site, nossa principal fonte de referência no mundo da aviação nos anos 2000. O texto é do Panda, algumas fotos e vídeos colocamos a parte, para contribuir com mais dados e informações.

NZ 901 - Morte no Continente Gelado (Blackbox do Jetsite)

Relato extraído da seção Blackbox do Jetsite

Aviação e a Antártida

A Antártida é um continente tão fascinante quanto desconhecido. Sua magnífica topografia intercala majestosas montanhas e gigantescas geleiras. Vulcões ativos cospem fogo e lava em meio ao continente gelado. Entre eles, o Monte Erebus é um vulcão de 3.794 metros de altura em plena atividade. Seu nome tem origem na mitologia grega: Erebus era a personificação das trevas, descendente de Caos. Habitava o Hades, submundo por onde os mortos tinham de passar imediatamente depois da vida terrena. Um vulcão de nome profético.



Desde que os exploradores Amundsen, Ross e Shackleton, entre outros, chegaram ao Pólo Sul nas primeiras décadas do século 20, um lugar de tantas belezas naturais permaneceria virtualmente deserto por décadas. Essa terra desconhecida seria visitada pelo grande público somente nos anos 70, quando uma empresa aérea neozelandesa começou a realizar vôos panorâmicos sobre o continente gelado. A Air New Zealand resolveu explorar comercialmente as belezas até então conhecidas por um punhado de intrépidos navegantes e exploradores. Afinal, a Nova Zelândia controla vastas áreas do território antártico e opera uma base no continente em conjunto com o governo da Austrália.

Em 15 de fevereiro de 1977, o primeiro voo charter decolou de Auckland, e após fazer escala em Chirstchurch, sobrevoou a Antártida antes de voltar ao país de origem. Ao pousar o DC-10, completou mais de seis mil milhas náuticas na viagem e 12 horas de voo. Um tremendo sucesso de público. Durante os verões austrais dos anos seguintes, a Air New Zealand operou vários vôos à Antártida. As aeronaves precisavam estar em perfeitas condições técnicas, pois não havia pistas de pouso que pudessem receber uma aeronave do porte do DC-10. Além disso, os pilotos precisavam passar por treinamento específico para a rota.

O comandante Collins foi um dos que recebeu o curso específico para o vôo. Quando finalmente chegou sua vez, foi informado que voaria junto a profissionais que não haviam participado de vôos antárticos nas semanas e meses anteriores, com exceção de um dos dois navegadores, Gordon Brooks. No entanto, junto aos tripulantes, na cabine de comando, estaria Peter Mulgrew. Ele era um experiente explorador e montanhista neozelandês, que já havia participado como narrador de vôos anteriores, além de ter percorrido a pé o território gelado.

O desastre do Voo NZ 901

Às 08h17 da manhã de 28 de novembro de 1979, o DC-10-30 de prefixo ZK-NZP, foi empurrado pelo trato para o pátio do aeroporto de Auckland. Sua decolagem foi ligeiramente atrasada: uma passageira teve uma crise de medo e pediu para desembarcar, minutos antes do DC-10 iniciar o taxi. O jato decolou sem qualquer problema para o vôo até à Antártida, com duração prevista de cinco horas até o ponto em que começaria a parte panorâmica da operação.

No computador de bordo, porém, as coordenadas inseridas no computador para a navegação automática continham um erro. Da maneira como estava escrita, a coordenada do último ponto fixo antes do sobrevôo panorâmico colocava o DC-10 em rota de colisão com o Monte Erebus. Um desvio de 45 quilômetros a leste do que seria correto foi programado no sistema de navegação pelos pilotos antes da decolagem de Auckland, seguindo à risca as coordenadas escritas pelo departamento de navegação da Air New Zealand. O DC-10 corria perigo antes mesmo de deixar o portão dois do aeroporto de Auckland. Entramos agora na cabine do DC-10, no momento em que a descida sobre a Antártida é iniciada.

Cap. Collins- Comandante Collins (assento da esquerda).
F/O Cassin - Primeiro-oficial Cassin (assento da direita).
F/E Maloney - Engenheiro de vôo Maloney (assento do engenheiro).
F/E Brooks - Engenheiro de vôo Brooks (observador).
F/O-RDO - Comunicação de rádio do primeiro-oficial aos controles de solo.
Cap.-PA- Comunicação interna do comandante aos passageiros e tripulantes.
MAC - Freqüência do nontrole MAC Center.
CAM - Sons gravados pelos microfones instalados na cabine de comando.

12h17:13 - Cap. Collins: "Acho que podemos começar a descer agora."
F/O: "Ok, vou ver se apanho alguma coisa no VHF."

12h18:05 - MAC: "Nós temos teto baixo, de aproximadamente dois mil pés e um pouco de neve caindo, visibilidade de 40 milhas, e se vocês quiserem, podemos dar um reporte mais preciso da posição de cobertura de nuvens na área."
F/O-1: "Sim, 901, seria ótimo. Nós gostaríamos de descer e manter nível de vôo uno-seis-zero."
12h18:41 - MAC: "Kiwi 901, Mac Center, desça e mantenha nível 160."
12h18:52 - MAC: "Kiwi 901, Mac Center, aqui é o meteorologista de novo. Parece que as áreas claras ao redor de McMurdo estão aproximadamente entre 75 e cem milhas ao noroeste de nós, exatamente sobre o estreito de McMurdo, onde está particularmente bastante nublado agora. Câmbio."

12h19:14 - F/O Cassin: "Entendido, New Zealand 901, obrigado."
12h19:22 - F/E Maloney: "Vai ser próximo do Cabo Bird, não é?"
Cap. Collins: "Não parece nada promissor, não é?"
CAM (alguns dos ocupantes da cabine respondem em uníssono): "Não mesmo!"

12h19:22 - MAC: "Num raio de 40 milhas de McMurdo, nós temos cobertura radar que pode permitir monitoramento, se vocês desejarem, para que vocês possam descer até 1.500 pés, seguindo vetoração de radar, câmbio."
12h20:07 - F/O Cassin: "Entendido, New Zealand 901, e aceito."
Cap. Collins: "É isso que nós queríamos ouvir."

O DC-10 começa então a descer rumo ao McMurdo. Mas as condições de visibilidade não ajudam em nada os esforços da tripulação do comandante Collins. O grande jato só tem à sua proa um mar de nuvens sobre a gelada vastidão da Antártida. Não é um bom dia para vôos panorâmicos, definitivamente. Mas o DC-10 e seus ocupantes não tinham outra alternativa, a não ser tentar se aproximar ao máximo e obter rápidas visões do continente gelado, mesmo que fossem em eventuais buracos entre as nuvens. Era com esses raros instantes que Collins contava ao levar o DC-10 cada vez mais baixo. Ao cruzar dez mil pés, o DC-10 ficou finalmente sob um manto de nuvens, e a visibilidade para baixo melhorou, permitindo agora uma visualização de grandes áreas ao redor da aeronave. Assim mesmo, as muitas nuvens impediam uma plena navegação visual.

12h31:01 - Cap. Collins: "Acho que vou ter que orbitar por aqui."

O comandante Collins referia-se ao setor à frente e à esquerda do jato. O engenheiro de vôo Brooks, debruçado sobre os três colegas, respondeu:

12h31:08 - F/E Brooks: "Não está nada claro aqui pelo lado direito."
F/O Cassin: "Nada claro."
12h31:20 - Cap Collins: "Se você conseguir um contato HF (High Frequency), diga ao controlador que nós gostaríamos de descer ainda mais. Diga que estamos avistando o solo e que, se necessário, vamos descer executando uma órbita."
12h32:07 - FO-RDO: "Nós gostaríamos de descer mais e poderíamos orbitar em nossa presente posição, aproximadamente 43 milhas ao norte de vocês, descendo em vôo VMC" (Visual Meteorological Conditions).
MAC: "Entendido Kiwi New Zealand 901, descida VMC aprovada e mantenha o controle, ciente de sua altitude."
FO-RDO: "Entendido, New Zealand 901, livrando nível 180. Reportaremos ao atingir nova altitude nivelada."

O DC-10 agora voava sem nuvens ao seu redor e o comandante Collins sentiu-se confiante para seguir o vôo manualmente. Desligou o piloto automático e iniciou uma suave curva descendente à direita. Ao mesmo tempo, ligou o microfone e transmitiu pelo sistema de PA (Passenger Announcement) uma mensagem aos ocupantes da aeronave.

12h34:21 - Cap. Collins: "Senhoras e senhores, comandante falando, estamos iniciando uma órbita em nossa presente posição. Desceremos para uma altitude abaixo das nuvens e então prosseguiremos para o estreito de McMurdo."
F/E Brooks: "Aí está Wilson" (ao avistar a geleira Wilson Piedmont).

O DC-10 estava agora suficientemente a oeste do Monte Erebus para sair de sua "sombra" na cobertura de radar. Um ponto na tela do transponder iluminou-se quando o contato com o solo foi estabelecido.

12h35:15 - F/O Cassin: "O transponder agora está respondendo."
12h35:20: F/E Maloney: "Nada ainda nessa freqüência?"
F/O Cassin: "Não."
Ao prosseguir, porém, em sua órbita, o DC-10 entrou novamente na "sombra" de cobertura da montanha, fato notado pelo primeiro-oficial.

12h36:32 - F/O Cassin: "Perdemos novamente o sinal. Vou voltar ao HF, Jim" (nome de batismo do comandante Collins).
Cap. Collins: "Eu preciso permanecer visual, então vou executar outra órbita aqui."
12h38:38 - FO-RDO: "901, nós tivemos um rápido contato na freqüência uno-uno-três-quatro-uno. Agora perdemos contato. Estamos mantendo dez mil pés, presentemente a 34 milhas ao norte de McMurdo."
Cap. Collins: "Diga a eles que vamos fazer uma descida visual na grade de 180 e fazer uma aproximação visual para McMurdo."
12h42:01- FO-RDO: "901, ainda negativo no contato em VHF. Estamos visual e gostaríamos de fazer uma descidana grade de 180 e aproximação visual para McMurdo."
12h42:01- MAC: "New Zealand 901, mantenha VMC. Nos informe de sua altitude ao se aproximar de McMurdo. Reporte a dez milhas."
Cap. Collins: "Estamos no visual se seguir por aqui. então vou por aqui."
12h42:59 - Mulgrew: "Ah, ótimo, eu não posso falar nada se não vejo nada."
12h43:27 - Mulgrew: "Ah, ótimo. Há um pouco de terra à frente."
12h43:31 - Cap. Collins: "Vou armar o NAV novamente. ALT, NAV CAP, IAS selecionado."

O comandante Collins liga novamente o piloto automático, que passa a navegar o DC-10 no vôo sobre a Antártida. A visibilidade é superior a 40 milhas. O centro MAC solicita uma confirmação das condições.

12h44:47- FO-RDO: "Ok, New Zealand 901, 50 milhas ao norte da base, estávamos a dez mil pés e agora estamos descendo de seis mil para dois mil, e estamos VMC."

O comandante vira-se para Peter Mulgrew e comenta:
12h45:26 - Cap. Collins: "Recebemos uma mensagem do vale de Wright e está claro por lá."
12h45:30 - Mulgrew: "Ah, ótimo."
12h45:32 - Cap. Collins: "Então, se você puder nos guiar por lá?"
12h45:34 - Mulgrew: "Sem problemas."

O guia Mulgrew pega o microfone e fala pelo sistema PA:
Mulgrew-PA: "Amigos, aqui é Peter Mulgrew falando novamente. Ainda não dá para ver muito aí fora. Vou mantê-los informados assim que se possa ver algo que nos confirme a nossa posição. Estamos descendo mais um pouco e não vai demorar muito para que tenhamos uma boa visão."

A falta de visibilidade deixa de sobreaviso os ocupantes da cabine, em especial o engenheiro de vôo Brooks, único que já havia voado sobre a região. Brooks está preocupado com a presença na área do monte Erebus, de mais de quatro mil metros de altura.

12h46:39 - F/E Brooks: "Onde está o monte Erebus em relação a nós neste momento?"
12h46:45 - Mulgrew: "À esquerda, umas 20 ou 25 milhas."
F/O Cassin: "Sim, sim."
12h46:48 - F/E Brooks: "Estou preocupado com terreno mais alto, é só isso."

Mulgrew checa a posição consultando um mapa e afirma mais uma vez: "Acho que à esquerda." O engenheiro de vôo Maloney concorda:

FE Maloney: "Sim, acho que é por aqui."

Mulgrew, que deveria ter certeza de sua posição, vacila:

Mulgrew: "Sim. Não, não. Não sei mais ao certo."
Por um buraco entre as nuvens, Mulgrew divisa um pico que parece ser território conhecido, devolvendo-lhe a confiança:

12h47:02 - Mulgrew: "Aí está a ponta."
12h47:05 - Cap. Collins: "Ok, provavelmente vamos ver melhor mais adiante."

O DC-10 inicia uma leve descida, abandonando a altitude de dois mil pés, evitando uma nova formação de nuvens.

12h47:49 - F/O Cassin: "Não está tão má" (a visibilidade).
12h47:54 - Mulgrew: "Estou reconhecendo Bird por aqui e a ilha de Ross bem ali. Erebus deve estar em algum lugar por ali."

O DC-10 agora está voando a 1.500 pés, aproximadamente 500 metros acima do mar gelado da Antártida, mantendo 260 nós de velocidade. Os paredões rochosos que ainda forneciam alguma referência ficam para trás e, pelos visores frontais do DC-10, as nuvens baixas agora começam a se fundir com a vastidão gelada da Antártida. Iluminadas pela luz do sol, nuvens e gelo se fundem numa massa disforme, sem contornos, infinita. Quando essas condições acontecem, de perda de referência e contraste entre céu e terra, a esse fenômeno dá-se o nome de Whiteout. Os tripulantes do DC-10, subitamente, perderam toda a referência visual, e toda a noção de distância e profundidade, levando o comandante Collins a comentar:

12h48:46 - Cap. Collins: "De fato, as condições não parecem nada boas, não é?"
Mulgrew: "Não, nada boas."

Para complicar, o rádio VHF perde o sinal. O comandante Collins instrui o primeiro-oficial Cassin a continuar tentando contato.

Mulgrew, sentado no jump seat atrás de Collins, vislumbra um pedaço de terra:

12h49:08 - Mulgrew: "Acho que vi um pedaço da ilha Ross ali."

A afirmação é feita sem nenhuma convicção. O enorme DC-10 voa a 500 metros acima do solo, sem praticamente qualquer referência externa. Se nada podia ser visto adiante, pelas janelas da cabine principal, os passageiros se mantinham ocupados, vislumbrando a paisagem lateral com mais de 40 milhas de visibilidade. O engenheiro Brooks não disfarça mais seu desconforto e ansiedade em face da incerteza de posição do DC-10.

12h49:24 - F/E Brooks: "Não estou gostando disso."
12h49:25 - Cap. Collins: "Sintonizou alguma coisa?"
12h49:27 - F/O Cassin: "Não."
12h49:29 - Cap. Collins: "Estamos a 26 milhas ao norte. Vamos ter de subir e sair dessa."

O primeiro-oficial Cassin então afirma que está livre à direita e que o DC-10 poderia fazer uma curva de 180 graus por esse lado se o comandante quisesse. Collins, no entanto, comenta que prefere curvar à esquerda, e que a visibilidade nesse setor é boa. Mulgrew comenta:

12h49:35 - Mulgrew: "Você consegue ver a ilha Ross? Ótimo."

O primeiro-oficial reafirma:

12h49:38 - F/O Cassin: "Está livre pela direita. Não há terreno elevado se você executar um 180" (curva de 180 graus).
12h49:44 - Cap. Collins: "Não. Negativo."

Collins preferia executar a curva pelo lado que ocupava. Antes, porém, de segurar o manche e iniciar a curva, o radioaltímetro ligado ao sistema GPWS começou a funcionar. O acionamento do GPWS (Ground Proximity Warning System) só poderia indicar uma coisa: que o enorme jato estava perigosamente próximo do solo. A gravação se fez ouvir, em alto e bom som, pela cabine de comando:
12h49:48 - CAM: Whoop, whoop! Pull up! Whoop whoop! Pull up!

Os seis ocupantes da cabine tiveram suas atenções galvanizadas pelo som de alerta. Do lado de fora, bem na proa do DC-10, nada era visível. Nenhuma elevação, nenhuma montanha ou pico. Apenas uma massa branca, uma traiçoeira fusão de nuvens e de gelo. Certamente, pensaram os pilotos, deveria ser uma indicação falsa, um alarme falso do GPWS. O que por sinal, não era uma ocorrência tão rara assim: o sistema costumava falhar e fornecer alarmes falsos. Mesmo assim, profissionais que eram, os tripulantes do New Zealand 901 redobraram a atenção. Assumiram suas funções como previsto em situações assim, como soldados que se colocam de prontidão para uma batalha. Em seus postos, em silêncio, é certo que a adrenalina começou a correr. Os olhos procuram uma referência de horizonte, em busca de algum obstáculo que pudesse ter acionado o alarme.

Os seis ocupantes não sabiam, mas a apenas uma centena de metros adiante do nariz do DC-10, havia mesmo um obstáculo. Um gigante invisível, um vulcão coberto de gelo, perfeitamente camuflado entre nuvens brancas. Uma montanha fantasma, escondida pela bruma marítima e pelas nuvens. Uma armadilha mortal, um pavoroso capricho do destino.

O engenheiro de vôo Brooks, o mais preocupado com toda a questão de navegação, pôs-se a ler, em voz alta, as indicações que o radioaltímetro fornecia sobre a altitude em que se encontrava o DC-10.

12h49:48 - F/E Brooks: "Quinhentos pés."
12h49:50 - CAM - GPWS: "Whoop, whoop! Pull up!"
12h49:52 - F/E Brooks: "Quatrocentos pés."
12h49:53 - CAM - GPWS: "Whoop whoop! Pull up!"

O comandante Collins seguiu à risca o procedimento em relação ao alarme do GPWS, apesar de nada enxergar à sua frente. Calmamente, ordenou ao engenheiro Maloney que acelerasse os três motores ao máximo. Sua voz saiu firme, sem trair emoção. Deve ter pensado que tratava-se apenas de mais um alarme falso.

12h49:57 - Cap. Collins: "Potência máxima, por favor."

12h49:59 - CAM - GPWS: "Whoop whoop! Pull..."

O alarme do GPWS foi interrompido bruscamente. Naquele exato instante, o DC-10 colidiu contra o Monte Erebus. A primeira parte a bater contra o terreno foi a parte inferior da seção dianteira da fuselagem, como se o DC-10 fosse uma gigantesca baleia de alumínio que se projeta de queixo contra o terreno. Numa questão de fração de segundo, a fuselagem se rompeu e a barriga do gigante colidiu violentamente contra as rochas sob a neve, abrindo uma cratera de quatro metros de profundidade na pedra. A seção mediana da fuselagem, juntamente com as asas, prosseguiu montanha acima, atropelando a parte frontal da fuselagem. A cauda, com o motor número dois ainda girando e produzindo potência, passou sobre todo esse inferno e prosseguiu morro acima por mais um ou dois segundos. Então também colidiu violentamente com o solo e desintegrou-se quase por completo.

Uma explosão devastadora tomou conta da gelada encosta do Monte Erebus. Os tanques de combustível do DC-10 ainda guardavam muitas toneladas de JET A-1, que explodiu e transformou um mar de gelo num mar de destroços calcinados. O rastro de destruição espalhou-se por 600 metros de comprimento por quase cem metros de largura.

Por volta das 12h50, o controle de McMurdo chamou o TE 901, sem obter resposta. Preocupado, o controlador tentou várias vezes, sem sucesso. Imediatamente, acionou os recursos de busca e salvamento. Por volta de 1 hora da manhã, a devastadora cena do desastre, perfeitamente iluminada pelo incipiente verão da Antártida, descortinou-se diante dos tripulantes de um C-130 Hércules da Força Aérea norte-americana. Nas semanas seguintes, investigadores recolheram os cadáveres e pertences dos 257 ocupantes do DC-10. Eram 237 passageiros e 20 tripulantes: 200 neozelandeses, 24 japoneses, 22 norte-americanos, seis ingleses, dois canadenses, um australiano, um suíço e um francês. Eventualmente, 213 ocupantes foram identificados. Os restos mortais de 44 ocupantes (que não tiveram suas identidades comprovadas) foram enterrados numa vala comum no local do impacto, no qual um monumento foi erguido em memória das vítimas.

Na Nova Zelândia, a perda do TE 901 colocou de luto todo o país. Aparentemente, cada habitante tinha um parente ou conhecido entre as vítimas. A Air New Zealand, reputadamente uma empresa que sempre primou pela segurança, tinha de dar uma explicação convincente para a tragédia. Logo começaram a circular boatos de falha operacional, o chamado erro humano. Aparentemente, a tripulação do NZ901 teria voado baixo demais, por entre nuvens, até colidir com o monte Erebus. Outra versão começou a ser divulgada: de que os dados de navegação inseridos nos computadores de bordo do DC-10 estariam errados, levando a aeronave, sob navegação do piloto automático, a colidir com o terreno. Em 19 de fevereiro de 1980, a Air New Zealand divulgou um comunicado oficial, ambíguo, que omitia eventuais erros de programação na navegação e deixava implícita a culpa do comandante Jim Collins pelo acidente.

Pilotos da Air New Zealand que conheciam Collins sabiam que um comandante com sua experiência e predicados jamais poderia ter cometido tamanha imprudência: voar às cegas sobre terreno montanhoso, em meio às nuvens, não parecia comportamento típico de um piloto como Collins. Um grupo de comandantes resolveu que era preciso arriscar o pescoço e tomar as dores do comandante morto. Liderados pelo comandante Gordon Vette, companheiro de Collins na Air New Zealand, e suportados pela associação de pilotos neozelandeses, declararam uma guerra de trincheira contra a própria Air New Zealand, refutando a teoria de "erro humano". Utilizando mais de 200 fotos retiradas de câmeras fotográficas recolhidas no local do desastre, comprovaram que havia visibilidade suficiente até o momento do choque. Investigações independentes levaram à conclusão final de que o plano de voo usado pelo comandante Collins, e plotado no sistema inercial de navegação do DC-10, levou a aeronave a descrever uma seqüência de curvas e órbitas que a colocou em rota de colisão com o monte Erebus. Descobriu-se que a Air New Zealand e seus principais executivos à época tramaram um plano para ocultar, omitir e destruir provas que levassem à descoberta do erro no plano de navegação. Dentre as ações tomadas pela empresa, até um assalto à casa do comandante Collins, visando encontrar e destruir eventuais provas de que ele agira corretamente, foi levado a cabo.

Afinal, comandantes mortos não se defendem. E isso era muito mais desejável, e sairia muito mais barato para os cofres da empresa, do que ter que assumir, publicamente, a culpa pela tragédia e arcar com as pesadas ações judiciais movidas pelas famílias das vítimas. A questão galgou instâncias na justiça neozelandesa, até que foi arbitrada pela Corte Suprema britânica que, em 1981, decidiu-se pela culpa da empresa, exonerando de responsabilidade o comandante Jim Collins e seu colegas de cabine. Justiça foi finalmente feita a Collins e aos demais tripulantes do TE 901. Mas o preço pago foi alto demais: 257 vítimas de uma trágica sucessão de erros.

Fotos do Desastre do Air New Zealand Voo 901

Acidente com o voo 901
Aeronave envolvida no acidente
Acidente com o New Zealand 901
Flight 901 Air New Zealand Disaster
Memorial Erebus para as vítimas do Voo 901
Blackbox do site Jetsite

Air New Zealand Voo 901
Air New Zealand Voo 901
Foto tirada por passageiro

Air New Zealand Voo 901 Air Crash Disaster

Air New Zealand Voo 901 Air Crash Disaster

Air New Zealand Voo 901 Air Crash Disaster

Air New Zealand Voo 901 Air Crash Disaster

Como era um voo de 'passeio' e turístico, os passageiros não perceberam o iminente perigo, e continuaram tirando fotos e mais fotos, o tempo inteiro, inclusive no momento do impacto.

Na foto abaixo, aparece um líquido na janela, que deve ser combustível ou algum fluido hidráulico:
Imagem de acidente aéreo de dentro do avião

257 vidas se perderam. E a foto anterior é de milissegundos antes da fatalidade ocorrer.
O avião bateu, o líquido foi expelido para todos os lados, atingiu a janela e nesse mesmo exato momento, um passageiro tirou a foto.

No instante seguinte, todos estavam mortos.

Mais informações:
https://en.wikipedia.org/wiki/Air_New_Zealand_Flight_901

Fonte: Este relato foi extraído do extinto site Jetsite, do grande Gianfranco "Panda" Beting, da seção Blackbox, com fins de não se deixar perder o conteúdo daquele fabuloso site, nossa principal fonte de referência no mundo da aviação nos anos 2000. O texto é do Panda, algumas fotos e vídeos colocamos a parte, para contribuir com mais dados e informações.

TY 981 - Silêncio na Floresta (Relato do BlackBox do Jetsite)

Arquivo de relato da seção Blackbox do Jetsite

Com o advento dos jatos de fuselagem larga em 1970, os especialista de segurança aérea começaram a se perguntar: o que poderia acontecer em caso de um acidente aéreo com uma dessas aeronaves, capazes de levar até 500 passageiros? Seria uma tragédia de imensas proporções, com um profundo impacto na sociedade e com repercussões igualmente grandes nos meios de comunicação, atraindo ainda mais atenção do que os desastres aéreos já naturalmente incitavam. Os piores medos desses especialistas iriam se tornar realidade pouco mais de quatro anos depois que a Pan Am inaugurou a Era dos Jumbos com seus Boeing 747.


O dia do Voo 981

O domingo 3 de março de 1974 amanheceu esplendoroso em Paris. Sem uma nuvem e com temperaturas amenas, denunciando a chegada, tímida ainda, da primavera na Europa. Naquela manhã também chegou a Paris - aeroporto de Orly, por volta das 11h00 e procedente de Istambul, um dos três DC-10-10 operados pela empresa turca THY - Turk Hava Yollari ou Turkish Airlines. Matriculado TC-JAV e batizado em homenagem à cidade turca de Ankara, o trijato era o maior motivo de orgulho da THY, a primeira operadora do tipo fora da América do Norte. Operando na empresa há apenas 16 meses, era então um equipamento moderníssimo.

O voo 981 chegou à capital francesa com apenas 167 de seus 345 assentos ocupados e em Paris desembarcaram 50 passageiros. Os 117 restantes prosseguiriam junto no DC-10 até seu destino final naquela manhã, o aeroporto de Londres - Heathrow, onde o voo 981 seria concluído e de onde o jato regressaria, com escala em Paris, para a capital turca.

Mas naquele mesmo fim de semana, a BEA - British European Airways - havia entrado em greve. Seus funcionários faziam exigências salariais antes da fusão da empresa com a BOAC, um acordo que acabaria por formar a poderosa British Airways. Cruzando os braços, os engenheiros da BEA deixaram milhares de passageiros no chão, transformando as viagens para o Reino Unido num verdadeiro caos. Os funcionários da THY, sabendo da situação, aproximaram-se dos balcões da companhia inglesa, oferecendo lugares no DC-10, que partiria em poucas horas. Em questão de minutos, os 216 assentos vagos já estavam tomados por uma esmagadora maioria de passageiros britânicos.

Alheia a todo essa agitação, os pilotos do TC-JAV preparavam-se para o curto voo através do Canal da Mancha. A tripulação técnica do DC-10 era composta pelo comandante Mejat Berkoz, auxiliado pelo primeiro oficial Oral Ulusman e pelo engenheiro de voo Huseyin Ozer. Com um maior número de passageiros fazendo o check-in, a partida do voo 981 atrasou-se em 20 minutos: as 12h20 finalmente, o comandante Berkoz chamou a freqüência de solo em Orly solicitando acionamento e push-back. As 12h24, o DC-10 iniciou o táxi para a cabeceira 08, de onde decolou normalmente às 12h29, pilotado naquela etapa pelo primeiro oficial Ulusman.

O Voo TY 981 da Turkish Airlines

Tomando inicialmente a proa leste, o jato voou por 35 milhas até ser autorizado a iniciar uma curva para o rumo 345, que o levaria a sobrevoar Montdidier e depois Amiens. Ao passar pela marca de 6.000 pés, o jato despediu-se da torre de Orly e contatou a freqüência de área Noroeste de Paris, sendo prontamente autorizado a subir diretamente ao nível de cruzeiro 230 - 23,000 pés. Informando estar cruzando 7,000 pés, o comandante Berkoz encerrou sua transmissão. Quatro minutos depois, as 12h40, a freqüência seria utilizada mais uma vez pelo voo 981, desta vez de forma assustadora.

Ecoando pelas ondas do rádio, uma transmissão preocupante, incompreensível, chegou aos ouvidos dos controladores franceses. Ouvia-se apenas um forte ruído ao fundo, o alarme de despressurização ecoando pela cabine de comando e uma cacofonia de vozes gritando entre sí - em turco. A transmissão durou pouco menos de trinta segundos, sem que nada tenha sido entendido. Nas telas dos radares, o retorno do DC-10 começava a contar uma história de final trágico: o DC-10 iniciava um desvio de sua proa autorizada, 345º. Simultaneamente, o eco secundário no radar de vigilância com o número do voo, "981" desapareceu da tela, restando apenas o eco primário que indicava a altitude do avião: 9,000 pés. Este desapareceu da tela segundos depois. A situação do voo 981 era mesmo séria.

A bordo do DC-10, a situação era mais do que séria: era dramática. Segundos antes, a porta de carga traseira da aeronave abriu-se em pleno voo, uma falha ocasionada por uma deficiência no mecanismo de travamento, um defeito conhecido por todos os operadores de DC-10 e remediado após modificações no sistema de fechamento. No dia 12 de junho de 1972, ou seja, 21 meses antes, a mesma falha quase havia derrubado um DC-10 da American Airlines, que conseguiu pousar com dificuldade. Embora o fabricante recomendasse urgência nas modificações, a troca não era "obrigatória", e sim "recomendável o quanto antes".

Mas os DC-10 da THY eram o orgulho da empresa e sendo assim, mal paravam no solo, voando muitas horas por dia: a modificação poderia esperar algumas semanas, pensaram os executivos da THY. Eles estavam prestes a cometer o maior engano de suas vidas. Um engano que custaria centenas de vidas inocentes.

Em ambos os casos, tanto no caso da American como agora no DC-10 da THY, a falha da porta provocou uma violenta descompressão, afundando o piso principal da cabine de passageiros. No caso da THY, os efeitos foram ainda mais sérios, pois a descompressão acabou sugando pelo vão da porta de carga dois conjuntos inteiros de 3 poltronas cada, com seis passageiros amarrados à elas. Esses seis passageiros, em retrospecto, talvez tenham tido mais sorte, pois suas mortes devem ter sido rápidas: desaparecendo no espaço e caindo segundos depois numa plantação perto da Vila de St. Pathus, foram poupados da agonia que seus outros colegas de infortúnio teriam de viver pelos 72 segundos seguintes.

Pior do que simplesmente sugar esses passageiros, o rombo na fuselagem e o consequente afundamento do piso cortaram os cabos de comando das superfícies de cauda, travando os controles do DC-10. O jato, que até aquele instante subia, perdeu instantaneamente a capacidade de ser controlados pelos pilotos e imediatamente entrou num mergulho, fato imediatamente notado pela tripulação no segundo seguinte à explosão:

  • Cmte. Berkoz: (surpreso) Ei! O que está acontecendo aí?
  • F/O. Ulusman: (nervoso) A fuselagem explodiu!
  • Cmte. Berkoz: Tem certeza?


O jato já iniciara seu mergulho final, suave a princípio, bem como uma curva para a esquerda, na proa de 280º, como foi notada em solo pelos controladores de radar. A bordo do DC-10, o Cmte. Berkoz ordenava aos gritos ao primeiro oficial Ulusman:

  • Cmte. Berkoz: Levante! Levante o nariz!
  • F/O Ulusman: (num tom desesperado) Não consigo! Os comandos não respondem!


Nesse momento, o mergulho já estava bem mais pronunciado, com o nariz mais de 20º abaixo da linha do horizonte, fazendo o DC-10 ganhar cada vez mais velocidade. O Cmte. Berkoz então reduziu as manetes de potência do jato.

  • F/O Ulusman: Não nos sobrou nada!


Apenas 23 segundos haviam se passado desde a explosão.

  • Cmte. Berkoz: Sete mil pés!


A situação era dramática e o DC-10 agora perdia altura rapidamente, a uma razão de mais de 6 mil pés por minuto. Ganhando cada vez mais velocidade, com mais 11 segundos, o alarme de excesso de velocidade (overspeed) começou a soar na cabine.

  • Cmte. Berkoz: Hidráulicos? Temos ainda o (sistema) hidráulico?
  • F/O Ulusman: (murmurando) Não consigo! Perdemos tudo!
  • Cmte. Berkoz: (num tom resignado) Parece que vamos mesmo bater no chão.


Então, apenas 56 segundos depois da porta de carga falhar, Berkoz tomou a iniciativa de tentar arrestar o mergulho. Sua idéia foi a de aumentar a potência dos motores das asas para tentar diminuir ou mesmo interromper o mergulho. Foi a única vez em toda a emergência que Berkoz pronunciou algo em inglês: todas as outras vezes, em todas as comunicações com os colegas na cabine, falou em turco. Esse é um fato comum sob severas condições de stress: o cérebro comanda a utilização da língua pátria, de maneira a poder concentrar a capacidade de raciocínio restante para tentar solucionar o problema.

  • Cmte. Berkoz: Speed!


Então o veterano comandante abriu as manetes de potência, mas apenas dos motores 1 e 3, de maneira a deixar o motor número 2, instalado na cauda, sem transferir potência ao jato. Desta forma, o DC-10 ficaria com a cauda mais "pesada" e quem sabe assim, a perda de sustentação na regão posterior da fuselagem conseguisse levantar o nariz do DC-10. A heróica tentativa de Berkoz foi em vão: apesar do ângulo do mergulho de fato haver diminuído, o DC-10 já voava muito próximo ao solo. Pelos dez segundos seguintes, a tripulação permaneceu estarrecida, vendo o solo aproximar-se cada vez mais, cada vez mais rápido.

Numa lúgubre e até hoje não explicada reação, um dos tripulantes na cabine do DC-10 começou então a assobiar um jingle publicitário popular na Turquia naquela época. A reação, tão inesperada quanto patética, ficou gravada na caixa preta do DC-10, um dos últimos sons humanos registrados no Cockpit Voice Recorder. Dois segundos antes do impacto, talvez agindo apenas por reflexo condicionado, o Cmte. Berkoz fechou as manetes de potência do trijato - a última ação que faria em vida.

O DC-10 entrou voando a 800 km/h nas árvores da floresta de Ermenonville, ao norte de Paris. A destruição foi de tal ordem que mal houve incêndio: apenas a explosão instantânea no momento em que os tanques se romperam, quando a aeronave bateu nas árvores. No entanto, a alta velocidade da aeronave no momento do impacto abriu uma clareira de 100 por 700 metros.

Os primeiros socorristas da Gendarmérie que chegaram ao local, quase uma hora depois da queda, não podiam acreditar no que viam: na enorme e fumegante área devastada, o que antes era um DC-10 com quase 350 ocupantes agora era um vasto campo coberto de destroços. Nenhuma grande parte da aeronave, nem mesmo a cauda e os motores podiam ser encontrados: apenas pedaços pequenos, fragmentados, irreconhecíveis. Um mar de roupas, objetos pessoais e milhares de pedaços de corpos mutilados cobriam o solo ou jaziam pendurados nos galhos das árvores, balançando ao vento.

Jacques Lannier, capitão da Gendarmérie, relatou que nem mesmo com muitas décadas de profissão, acostumado portanto a ver as piores cenas, jamais vira nada semelhante. Seu depoimento é pungente:

"Uma das primeiras coisas que vi foi um par de mãos humanas, uma masculina e uma feminina, agarradas num aperto firme. Somente as mãos, amputadas na altura dos pulsos. Nada mais... A quantidade de corpos e a horrível mutilação de quase todos eles... Meu Deus, nunca vi nada assim... Mas o pior mesmo foi encontrar o corpo de uma menina e sua boneca, ambos pendendo de uma árvore. Não aguentei e chorei ali mesmo. Sou soldado, mas também sou pai de uma garotinha da mesma idade."

Naquela manhã ensolarada, a queda do DC-10 da Turkish Airlines marcou o início de uma série de acidentes fatais que manchariam para sempre a imagem do trijato construído pela McDonnell Douglas. Outros desastres marcariam para sempre, com trágicos matizes, a história desse grande avião. Relatos de acidentes que você vai conhecer em próximos artigos na seção Black Box.

Imagens do Voo Turkish Airlines 981

Acidente TY 981 - Desastre aéreo Turkish Airlines Flight 981 DC 10

Acidente TY 981 - Desastre aéreo Turkish Airlines Flight 981 DC 10

Acidente TY 981 - Desastre aéreo Turkish Airlines Flight 981 DC 10

Acidente TY 981 - Desastre aéreo Turkish Airlines Flight 981 DC 10

Acidente TY 981 - Desastre aéreo Turkish Airlines Flight 981 DC 10

Acidente TY 981 - Desastre aéreo Turkish Airlines Flight 981 DC 10

Acidente TY 981 - Desastre aéreo Turkish Airlines Flight 981 DC 10

Acidente TY 981 - Desastre aéreo Turkish Airlines Flight 981 DC 10

Acidente TY 981 - Desastre aéreo Turkish Airlines Flight 981 DC 10


Fonte: Este relato foi extraído do extinto site Jetsite, do grande Gianfranco "Panda" Beting, da seção Blackbox, com fins de não se deixar perder o conteúdo daquele fabuloso site, nossa principal fonte de referência no mundo da aviação nos anos 2000. O texto é do Panda, algumas fotos e vídeos colocamos a parte, para contribuir com mais dados e informações.